Diploma e ética profissional

Por Aloísio Martins 

Às vezes, quando me perguntam sobre a importância do diploma para o exercício da profissão de jornalista, gosto de lembrar do tempo em que comecei na profissão, na década de 70, quando inúmeras pessoas trabalhavam no ofício sem terem passado por uma escola de formação profissional. Logicamente, a grande maioria exercia um jornalismo de qualidade e ético. Mas alguns profissionais esbanjavam também na falta destes quesitos.

Como exemplo, gosto de citar o caso de um jornalista (não é o caso de citar seu nome, inclusive porque hoje ele já é falecido) que ganhou dois ou três prêmios Esso, era tido como excelente repórter, mas, no exercício da profissão, dava um show no que diz respeito à falta de ética.

Digo isso porque pude testemunhar o tal jornalista em dois momentos. Primeiro, ao vê-lo atuar como repórter policial e, duas décadas depois, quando pude copidescar os seus textos e constatei que se tratava de um semi-analfabeto, o que, certamente, poderia justificar o fato de desconhecer certos conceitos éticos.

Um filme a que já assistimos

Esse jornalista sem diploma e sem compromisso com a ética não fazia entrevistas, mas, sim, interrogatórios com os personagens que por acaso iam parar nas mãos da polícia. Gritava ou empurrava com os presos, pés-de-chinelo ou não. Outra coisa: em plena ditadura, ele não questionava e achava normal ver policiais torturando presos com a cocota (uma sola de pneu usada para bater nas palmas das mãos dos presos). Para ele, a tortura era tida como um ofício corriqueiro contra os presos e não era notícia, mesmo que acontecesse à sua frente.

Acho que é aí que entra a importância dos cursos de Jornalismo para o exercício da profissão. Além de qualificar os futuros profissionais, os cursos são importantes não só para melhorar a qualidade da informação, mas, sobretudo, para comprometer o jornalista com a ética.

O fim da necessidade da formação profissional representaria também o fim do compromisso dos “jornalistas” com o Código de Ética da profissão. Isso abriria as portas do jornalismo para os picaretas, que passariam a usar a informação em interesse próprio, sem qualquer compromisso com a sociedade e com a ética, um filme a que já assistimos muito no passado, antes da regulamentação da profissão.

Para mim, este aspecto, por si só, já justifica a necessidade do diploma para o exercício da profissão. Aliás, se o jornalismo melhorou em qualidade nas últimas décadas deve-se, sem dúvida, às escolas de Comunicação.

3 comentários em “Diploma e ética profissional

  1. Muito pertinente o artigo.
    Já imaginamos como será exercido o jornalismo no interior do Pará, onde ainda se morre por encomenda?.
    Rádios, jornais e tevês vão virar depósito de pistoleiros, mercenários, políticos e descocupados.
    Embora reconheça o trabalho de colegas sem formação superior no interior, posso atestar que muitos desses profissionais têm procurado os cursos de comunicação em busca de uma melhor qualificação.
    Em Santarém, tenho alunos de jornalismo de sete municípios da região Oeste do Pará. Eles relatam as dificuldades de trabalhar sem base humanística e aprimoramento intelectual.
    Mas agora, com a decisão do STF, as empresas estão livres para contratar quem bem quiserem. Inverteu-se o direito à livre manifestação. Não se trata deste ou daquele cidadão sem graduação em jornalismo ter livre acesso ao mercado de trabalho. A vez será da empresa decidir quem vai escrever o que a empresa julga de seu único interesse. A sociedade que se dane.
    Me preocupa, ainda, os baixos salários e as precárias condições de segurança em que os profissionais do interior são submetidos diariamente.
    Se com uma legislação, embora defasada, as empresas usam e abusam, imaginem agora, que a categoria ficará errante, sem os mínimos direitos trabalhistas.

    1. Miguel,
      Fiquei triste e indignado ao ouvir o resultado do julgamento do Supremo. É inadmissível que ministros da Corte mais alta do país usem argumentos tão rasos para decretar a inutilidade do diploma e dos cursos de Jornalismo. Se os cursos são deficientes, funcionam precariamente e têm docentes igualmente fracos, que se lute então para melhorá-los, jamais extingui-los (porque, na prática, foi o que se decidiu ontem). Sou um jornalista da velha safra, mas defendo ferozmente a qualificação e o compromisso ético que só as escolas de Jornalismo proporcionam ao estudante. Não creio em improvisações e bravatas que atribuem ao jornalismo um caráter eminentemente romântico. Jornalismo é uma profissão comprometida com as pessoas e com o mundo, não pode ser tratado de maneira tão superficial e rasteira, como ontem no STF.

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