Por André Forastieri
O governo é melhor que sua comunicação? Hora da nossa geração soltando o osso

Depois de técnico de futebol, outra profissão favorita do brasileiro deve ser “marketeiro do governo”. Impressionante quanta gente encontro com soluções mágicas para melhorar a comunicação do governo Lula. Porque vamos combinar, ela não é aquela coca-cola toda.
E também vamos combinar que esse governo erra bastante, mas ainda assim acerta mais que erra. Veja o noticiário de hoje.
Quem fora Lula & cia. ia amarrar tão amarradinha uma proposta pra isentar do IR mais de 10 milhões de brasileiros pobres, ao mesmo tempo impondo justíssimos impostos sobre os mais ricos?
Naturalmente, as preocupações com a comunicação do governo estão mais à esquerda. Inclusive muitos que não morrem de amores por Lula. Mas todo o mundo que está do lado de cá faz figa por um salto na popularidade que nos protege de uma avalanche direitosa na eleição de 2026.
Adivinha: eu também tenho um pitaco pra dar.
Segundo as estimativas mais recentes, 62% da população brasileira tem menos de 40 anos. Pois o ministério de Lula só tem uma pessoa com menos de 40 anos. A exceção está lá por herança, como é o caso de tantos políticos de carreira. É André Fufuca, 35, ministro dos Esportes.
É uma evidência gritante de que os jovens brasileiros são muito mal representados na política, e em particular nas gestões ditas progressistas. Quem dá as cartas geralmente são coroas que em breve baterão com as dez.
Minha solução para remediar isso é simples, talvez simplória. Mas acredito piamente que garantiria um belo salto na popularidade do governo Lula.
Sugiro uma reforma etária no ministério: metade dos ocupantes deverá ter até 39 anos. Vamos chamar essa faixa abaixo dos 40, generosamente, de jovens. “Oficialmente” jovem é até os 25, mas tudo bem.
Qualquer projeto político que não estimule, valorize e abrace a participação e liderança dos jovens está fadado ao fracasso. Isso significa que os jovens estão em posições de visibilidade e responsabilidade.
A questão é que as forças de direita, no Brasil e fora, têm sido muito mais eficientes neste quesito. Jovens com ideias reacionárias vem ganhando espaço para atuar e crescer em poder e influência. E não só na ultra direita caricatural. Também eletrizaram a direita tradicional.
As gestões à esquerda devem abrir espaço vital para jovens com ideias e práticas novas e arejadas. Se o tal progressismo não dividir a rapadura, está fadado à obsolescência.
Não se trata de “renovar os quadros”, como sempre ouvimos. Esta é uma postura condescendente, papo de Cavaleiro Jedi cagando regra pro jovem padawan.
Os jovens têm perspectivas e competências e conexões diferentes e, em muitas áreas, superiores. Os jovens devem orientar as coroas. E vice-versa.
O imobilismo está no DNA de qualquer instituição. Pra sair da inércia é básico chacoalhar. A energia jovem é crucial para isso.
Envelhecer faz o sujeito avesso a riscos. Quem diz? A ciência. Por exemplo, a bióloga e neurocientista Suzana Herculano-Houzel. Em artigo no último sábado, ela diz:
“… toda ação custa tempo e energia, um cérebro adulto não dá ponto sem nó: não age sem enxergar essa ação algum retorno positivo, que em retrospecto é o que a gente chama de motivo para a ação.
A qualificação “adulto” é importante, pois o cérebro infantil vive de fazer as coisas simplesmente porque pode: envelhecer primeiro e pensar depois, literalmente, juntando ação e consequência, que é aliás como o cérebro aprende tanto meio quanto os motivos.
Mas um cérebro adulto? O corpo é bem maior e pesado, a inércia é grande, e para passar à ação é preciso uma expectativa de resultado que sirva de cenoura na ponta da varinha.”
E entre o cérebro infantil irresponsável e o cérebro conservador adulto, o que temos? O cérebro jovem, meus amigos.

Não defendo o extermínio dos velhinhos não, feito aquele filme de Charlton Heston, “No Mundo de 2020”, todos abatidos e transformados em ração.
Etarismo zero. Até porque faço 60 esse ano. Nós coroas temos diversas qualidades: janela & repertório, paciência & prudência, cicatrizes de refregas passadas. Muitos até se adaptaram bem a essas modernidades de 2025. Uso IA e pronomes neutros todo dia, que tal?
Mas convenhamos que é absurdo, num país tão jovem, que as pessoas mais influentes do governo federal sejam da minha idade ou mais velhos.
Inclui o recém-empossado chefe de comunicação, Sidônio Palmeira (67). No primeiro mandato de Lula, Luiz Gushiken assumiu o mesmo cargo com 51. Aliás, o ministério de Lula 1 tinha idade média na casa dos 40 pra 50 anos.
Macron tornou-se presidente aos 40 na França. Meloni, primeiro-ministro na Itália aos 45. JD Vance é um vice protagonista aos 40 nos EUA e obviamente foi escolhido também para dar uma rejuvenescida na chapa.
É imaginável algo semelhante no Brasil? É – mas como nestes casos, não pelo lado à esquerda. Visualize Lula (81) debatendo na TV com Marçal (37), Ratinho Júnior (43), Tarcísio (49) ou os Bozo-kids (43 e 40, tesconjuro).
Lula parece estar tão lúcido quanto a qualquer um desses e certamente tem um currículo de realizações bem mais taludo. Não é o ponto. Será “Bidenizado” e o processo já começou. Não é só pela idade do homem em si. É pela baixa octanagem do conjunto do governo.
Daqui até a eleição tem chão. Mas seremos lembrados do tempo todo de que se Lula ganhasse, seu próximo mandato seria cumprido entre os 81 e os 85 anos.
Daqui até lá, Lula continuará sendo Lula e falando coisas que um homem nascido em 1945 fala. Inclusive algumas que serão acusadas de antiquadas ou misóginas.
São escorregadas suaves, perto das escrotidões que Bolsonaro soltou? Tanto faz. Quando Lula der uma bobeada ou soltar alguma piada questionável, ela será sempre ampliadíssima pelos hostes da direita pra isso virar “O” assunto.
Insistirão que Lula está desconectado da realidade, venceu a validade etc. Convencerão muitos.

As melhores mentiras se fundamentam na verdade. Os melhores truques escolhem um ponto fraco real e constroem sobre seu castelo de cascata. Foi o caso do Pix.
O vídeo foi planejado pelo marketing do PL, maior partido de oposição ao governo. Escalaram Nikolas Ferreira para protagonizar porque jovem, popular e agressivo.
Foi espertamente refeito por Erika Hilton e não pelo governo. Ela foi bem, mas não dispôs do impulso pago necessário para seu vídeo arriscado. Porque o PSOL não tem os bolsos fundos do governo federal, onde não faltam verbos para comunicação.
É assim o novo debate político, esse é o território; os donos dele são as Big Techs; e quem sabe guerrear nele são os jovens. É previsível que pessoas que amadureceram no já distante século 20 sejam menos hábeis com esses desafios ultra-contemporâneos. E não só na comunicação.
Foi o que aconteceu na semana passada. Em vez dos assuntos serem o “Consignado CLT” e a chegada de Gleisi Hoffman (59), conforme a estratégia palaciana, o que bombou foram os supostos machismo e obsolescência de Lula.
Inútil se indignar com a injustiça dos comentários ou soltar uma notinha. O governo quer impactar o eleitor jovem, mas não tem jovem na linha de frente. Quer deixar sua marca sem marketing. Quer influência sem influenciadores. Fica difícil.
Ouço muito o argumento de que as redes sociais e a grande imprensa seriam “espaço da direita”. Bem, nossa sociedade como um todo é “espaço da direita”. A direita é hegemônica. Tem mais dinheiro, influência, finanças políticas, tem a benção dos religiosos. Isso é dado desde sempre. É como reclamação que o sol nasceu hoje.
Alguns jovens políticos à esquerda provam que é possível jogar bem esse jogo e até ganhar. Investem esforço e dinheiro e tempo e tempo, e já entram em campo com uma vantagem enorme: são nativos digitais.
Adoraria ver alguns deles como ministros. Ainda mais alguns com milhões de seguidores nas redes sociais. Imagine a diferença que eles poderiam fazer no debate público, no ataque e na defesa.
Pense dez vezes antes de criticar em público um político jovem e razoável. Prefira acompanhar e divulgar o que eles fazem de interessante ou importante.
Pra ficar em alguns exemplos aqui de São Paulo, o Guilherme Cortez, deputado estadual, 27 anos. Tabata Amaral, federal, 31. Ou as vereadoras Luna Zarattini, 31, e Keit Lima, 33. Tem outros por aqui e por aí. Não é preciso adorar tudo que a moça ou o moço fazem. Seitas são para fanáticos.
Se você ficar procurando pêlo em ovo, matará no ninho todos os jovens políticos. Seguirão todos o caminho de Manuela d´Ávila. Vão compreensivelmente abandonar as chaturas da política e militar em ONG. Ou vai ganhar dinheiro. Ou dar outros pulinhos.
Talvez você planeje votar em Lula em 2026. Eu também, se é quem teremos contra a direita trogla. Pelas pesquisas de intenção de voto, estamos em companhia cada vez menor.
Mesmo quem cravou o “13” em 2022 tá achando o governo pão-com-molho. Se não inspira tiozinhos que votaram pela primeira vez no PT nos anos 80, como eu, imagine o eleitor de 25 anos. De novo: tem chão até a eleição, mas…

Há outros fatores para considerarmos além da idade? Evidente. O poder precisa de mais pessoas que venham das aulas CDE; de muito mais diversidade de raças e gênero. Começam a se multiplicar figuras assim no legislativo, como conta essa matéria listando deputados LGBT+.
Mas nos principais cargos dos executivos federais, estaduais e municipais, os diferentes continuam raridade. Uma foto do Poder no Brasil será mais fiel para um homem velho, branco e abonado.
O governo tem um problema de comunicação. Mas como a maioria dos problemas de comunicação, ele é antes de mais nada um problema de produto. Tem hora que o produto envelhece e não seduz tanto quanto antes. O consumidor quer sempre novidade, reza a cartela publicitária.
Minha solução mágica taí, então: um choque de juventude. Meio ministério abaixo dos 39 anos. Shazam!
Passou da hora da minha geração soltando o osso – e mais ainda a geração do Lula, que tem idade para ser meu pai. Aceitemos compartilhar o poder com nossos filhos e netos. Vale lembrar: Lula tinha 34 anos quando fundou o PT.
Vamos apostar na visão, na tesão e na imaginação de quem tem mais a perder que a gente. O futuro é literalmente dos jovens. Eles, eles, elus é que vão morar lá.
E a gente não.