
POR GERSON NOGUEIRA
Eu já sabia. Algo me dizia que nem a vantagem pantagruélica (5 a 0) seria capaz de tornar o jogo da volta menos laborioso e sofrido. A verdade é que desde a goleada imposta no Nilton Santos comecei a alimentar, em ritmo crescente, o pavor de um vexame. Na hora do jogo, quarta-feira à noite, o medo de uma desgraça já era quase um fato concreto.
Parece bizarro – e é –, mas temia verdadeiramente que o Botafogo fosse suplantado pelos uruguaios. Vários argumentos lógicos apontavam na direção contrária, mas justamente por ser botafoguense eu sei que argumentos lógicos não valem para o Botafogo.
Pouco importa se este é o melhor Botafogo desde a Selefogo de 1962/1963 e 1968/1969. Não adianta pensar que a esquadra de Savarino está invicta há 14 jogos e atropelou três potências da Libertadores – Palmeiras, São Paulo e o próprio Peñarol. Sei que meritocracia é zero, menos que zero, na régua ultrarrealista do futebol.
(Estou consciente e conformado quanto ao determinismo histórico: não há nenhum outro ser no universo capaz de pensar como um botafoguense.)
Todo esse conflito, de esperança e dúvida, tornou o ritual pré-jogo ficar mais tenso do que o normal. Minhas angústias aumentaram quando Artur Jorge optou por escalar um time mesclado. O técnico foi racional, preservou os craques que estavam “amarelados”. Discordo dele, sou alérgico à racionalidade quando o assunto é a Estrela Solitária.

A bola rola e a pressão intensa dos uruguaios desde o primeiro minuto se torna perigo real e imediato com aquele gol logo aos 30 minutos. E que golaço. Chute perfeito, que pegou na veia, daqueles que só pegam na veia contra nós.
Eles ainda precisavam de quatro gols. Agoniado, fiz as contas: eles SÓ precisavam de quatro gols. Concluí que era matematicamente possível. Pânico.
“E como ninguém marca esse Leo Fernandes!?”. “Alguém fecha esse corredor esquerdo! Marca a entrada da área, não deixa chutar!!”. Meus berros se perdem nas profundezas do vazio.
Cabe dizer que estava paramentado com as vestes da sorte. Botei a velha camisa alvinegra, o boné surradinho, que divide espaço honroso com o de Lula/2022. Sozinho, contrito e recluso, pois não ouso submeter ninguém aos arroubos verbais que o Glorioso desperta.
Um palmo abaixo do televisor, Nossa Senhora da Medalha Milagrosa reina absoluta, na silente companhia de Nazaré, Aparecida e São João, reforços de peso. Tudo em seu devido lugar, com calculado respeito à simetria. Blindagem total no plano místico-religioso.
Nesses momentos aflitivos, o poeta Gil vem sempre em meu socorro. Até que nem tanto esotérico assim; se eu sou algo incompreensível, meu Deus é mais. As origens baionenses explicam a fé cega nos ícones católicos, o Botafogo explica o apego à superstição.
Os desatinos da encarniçada peleja me fazem desligar a TV de tempos em tempos. Desligo as imagens terrificantes dos avanços inimigos. Por conta disso, fui poupado da ira com o pênalti desmarcado, mas quase perdi a tabelinha infernal que resultou no gol de Thiago Almada.
E lá vem a pissica dos minutos finais, terror de todo botafoguense. Diego Aguirre instala uma torre no ataque. Sinto-me impelido a adentrar a cancha para reforçar a bateria antiaérea, junto com Danilo, Adryelson e Barboza. Terminei exausto, mas, do alto de meu 1,66, acho que contribuí.
O placar, ainda vexaminoso de 3 a 1, nos basta. Ufa! Estamos na final, como nunca antes. Comemoro, decibéis de palavrões em fúria. Às favas com a modéstia, goleamos por 6 a 3! Vamos buscar a Glória Eterna!
Para encerrar esta opereta de agonia e êxtase, um trechinho do hino que me leva às lágrimas desde menino: “Na estrada dos louros, um facho de luz; tua Estrela Solitária te conduz”.
O Botafogo está sempre no caminho certo – o caminho da luz. Feliz da criatura que tem por guia e emblema uma estrela. Mestre Armando Nogueira era um profeta.

(Tomo aqui a liberdade de publicar este relato confessional e emocionado sobre o jogo Peñarol x Botafogo, originalmente escrito para o blog da amiga jornalista Syanne Neno)
Bola na Torre
Guilherme Guerreiro apresenta o programa, a partir das 22h, na RBATV. Participação de Giuseppe Tommaso e deste escriba de Baião. Em pauta, os primeiros passos do Remo para a próxima temporada e os preparativos do PSC para o confronto com a Ponte Preta, na segunda-feira, em Campinas. A edição é de Lourdes Cezar e Lino Machado.
Tuna dá sinais de que a base voltou a ser forte
Precisamos falar da boa atuação da Tuna contra o São Paulo, nas quartas de final da Copa do Brasil Sub-20, na quinta-feira (31), no estádio do Souza. O placar de 1 a 1 não expressa na totalidade as chances que a Lusa teve para vencer o Tricolor paulista, favorito no confronto.
No 1º tempo, a Tuna teve mais posse de bola e criou pelo menos duas grandes chances, mas errou nos arremates. O São Paulo foi mais objetivo e abriu o placar com Manso aproveitando rebote de Maranhão na trave.
Davizinho empatou para a Tuna logo no início do 2º tempo, após uma confusão na área do São Paulo. Giovane ainda teve excelente oportunidade para virar o jogo, mas os buracos no gramado atrapalharam o chute.
O equilíbrio da partida deu a impressão de que a Tuna está voltando aos seus bons tempos nas divisões de base. A volta será na quinta-feira (7), em Cotia, no CT do São Paulo. A Lusa está classificada para a Copa SP de Juniores.
(Coluna publicada na edição do Bola de sábado/domingo, 02/03)