De rainha do rock a diva do pop, o grande legado de Rita Lee, que morreu hoje aos 75 anos

Rita Lee, uma das mais populares cantoras e compositoras do pop-rock brasileiro, morreu nesta terça-feira (8), aos 75 anos. Ela foi diagnosticada com câncer de pulmão em 2021 e vinha fazendo tratamentos intensivos contra a doença. Nas redes sociais, a família divulgou uma curta mensagem: “Comunicamos o falecimento de Rita Lee, em sua residência, em São Paulo, capital, no final da noite de ontem, cercada de todo o amor de sua família, como sempre desejou”. O velório será aberto ao público, no Planetário do Parque Ibirapuera, na quarta-feira (10), das 10h às 17h.

De carreira bem sucedida, nas décadas 80 e 90, Rita começou a carreira dentro do rock puro ainda nos anos 70 como vocalista e compositora dos Mutantes, banda liderada por Arnaldo Baptista, com quem ela foi casada. Com a banda, ela contribuiu para incorporar a revolução do rock à torrente criativa do tropicalismo. Depois de ganhar relevância pelo trabalho com os Mutantes, ela partiu para uma carreira solo recheada de hits de forte apelo comercial.

Rita despontou também como referência de criatividade, irreverência e independência feminina durante quase seis décadas de carreira. O título de “rainha do rock brasileiro” veio quase naturalmente, embora contestado por ela, que considerava o termo “cafona” – preferia o pretensioso “padroeira da liberdade”.

Rita Lee Jones nasceu em tradicional família paulistana. Filha do dentista Charles Jones, descendente de norte-americanos, ela começou a se envolver com música ainda na infância, incentivada pela mãe, Romilda Padula, que era pianista.  

Logo aos 16 anos, Rita participou de um trio vocal feminino, as Teenage Singers, que fazia apresentações amadoras em escolas. O cantor e produtor Tony Campello descobriu o grupo e chamou as garotas para participar de gravações como backing vocals.

COM OS MUTANTES

Depois disso, ela entrou para uma banda de rock chamada Six Sided Rockers, que seria a semente dos Mutantes, oficialmente criado em 1966, com Arnaldo Baptista, Rita Lee e Serginho Dias Baptista. O nome foi atribuído ao grupo por Ronnie Von. Ícones da fase inicial do tropicalismo, adicionando psicodelia aos elementos básicos da música brasileira, ganharam prestígio internacional, reverenciados até hoje por artistas do porte de Kurt Cobain, Jack White e David Byrne.

Os Mutantes tiveram participação importante no álbum-manifesto “Panis et Circensis” (1968), que lançou as bases da Tropicália no Brasil. Fizeram apresentações em festivais ao lado de Gilberto Gil e Caetano Veloso. Rita ficou nos Mutantes de 1966 a 1972, gravando os cinco primeiros discos da banda. A conturbada separação do marido, Arnaldo, coincidiu com o afastamento dela do grupo.

RAINHA DO POP

Depois da experiência com os Mutantes, Rita tocou com o grupo Tutti Frutti, que tinha como destaque o guitarrista Luiz Sérgio Carlini. Com o Tutti Frutti, ela gravou cinco discos. “Fruto Proibido” marcou época, com canções como “Agora só falta você” e “Esse tal de Roque Enrow”.

Casou com o produtor e guitarrista carioca Roberto de Carvalho e, a partir de 1979, firmou uma parceria que se revelaria muito bem sucedida, dando uma guinada rumo a canções mais pop. Perdeu muitos fãs roqueiros, mas ganhou um público maior, com músicas grudentas, quase todas incluídas em trilhas de novelas. O imenso sucesso de vendas fez Rita virar uma superstar do pop-rock nacional.

Entre seus álbuns de maior sucesso está “Rita Lee”, de 1979, com os hits “Mania de Você”, “Chega mais” e “Doce Vampiro”. No ano seguinte, Rita mergulhou ainda mais no pop, com “Lança perfume” e “Baila comigo”. Em seguida, vieram os discos “Saúde” (1981) e “Rita e Roberto” (1985), cujo repertório foi a base da apresentação de ambos no palco do Rock in Rio 1. 

LONGE DOS PALCOS

Com o álbum “A Marca da Zorra”, de 1995, ela voltou à cena após quatro anos afastada da música, período no qual ficou separada de Roberto de Carvalho. Com o disco, ela foi chamada para abrir os shows dos Rolling Stones no Brasil. Ao cair de uma varanda em seu sítio, em 1996, Rita quebrou o recôndito maxilar. Iniciou um período de luta para largar o álcool e as drogas. Admitiria depois que só conseguiu ficar “limpa” em 2006.

Muito fragilizada fisicamente, Rita decidiu parar com os shows. Foi em Aracaju, em 2012, que ela fez o show anunciado como último da carreira. Ao discutir com um policial, foi acusada de desacato e detida.

O último álbum de inéditas em estúdio veio em abril de 2012: “Reza”, a faixa-título, foi definida pela própria Rita como “reza de proteção de invejas, raivas e pragas”. No total, foram 40 álbuns, sendo 6 dos Mutantes e 34 na carreira solo, alguns brilhantes, outros nem tanto.

SUCESSO NA LITERATURA

“Rita Lee: uma autobiografia”, de 2016, foi seu primeiro livro não-ficcional e contém revelações curiosas sobre a vida da cantora. Lá, ela conta que foi abusada sexualmente aos 6 anos por um técnico que foi à sua casa consertar uma máquina de costura. Fala, com amargura, sobre a expulsão dos Mutantes, em 1972, e descreve a luta para abandonar o alcoolismo.

Além da autobiografia, é autora da série “Dr. Alex”, de 1983, relançada em 2019 e 2020, com foco na defesa da causa animal e ambiental, ajudando a preencher um lado sempre criticado na trajetória de Rita: a falta de engajamento e ativismo político. Em março deste ano, foi anunciado o livro “Outra Autobiografia”, que está em fase de pré-venda na internet.

Em maio de 2021, Rita foi diagnosticada com câncer de pulmão. Ela foi submetida a tratamentos de imunoterapia e radioterapia. Quatro meses depois, lançou o último single da carreira, “Changes”, em parceria com o marido Roberto de Carvalho e o produtor Gui Boratto.

Rita foi uma artista de múltiplas qualidades, voz singular e letras marcantes. Soube transitar do rock ao pop sem perder relevância. Ganhou novos públicos e deixa um legado respeitável.

(Com informações da Folha SP, Rolling Stone, O Globo)

Deixe uma resposta