O lado bom do triunfo argentino

POR GERSON NOGUEIRA

O título da coluna parece meio sem sentido diante da verdadeira comoção que tomou conta do Brasil pela vitória da Argentina na Copa do Qatar, algo inteiramente impensável há alguns anos. A demonstração de caráter desportivo por parte da torcida verde-amarela é ainda mais impressionante por ignorar que a centenária rivalidade ficou ainda mais acirrada com a terceira conquista mundial deles.

Há uma inegável demonstração de elegância no apoio que a maioria dos brasileiros manifestou à Argentina – coisa que eles jamais fariam pela gente – e pela sincera alegria com o resultado sobre a França. Só os realmente grandes são capazes de se alegrar com os que se alegram, mesmo que estes menosprezem o Brasil sempre que têm oportunidade.

Testemunhei várias manifestações de hordas de argentinos nas ruas de Doha, antes e depois da grande final. Em todas as ocasiões, invariavelmente, a música mais festejada é o velho hino provocativo ao Brasil e ao Rei Pelé, figura que eles achincalham, considerando-o abaixo de Maradona. A canção prega que “Maradona é maior do que Pelé” e o refrão ataca: “Brasil, me diz como se sente, ter em casa seu papai”.

Aliás, a primeira vez que ouvi essa cantoria anti-Brasil foi na Copa do Mundo de 2014, quando esperava a decisão Alemanha x Argentina. Nas ruas do Rio, eles saíam cantando em voz alta e espicaçando os brasileiros. Pelo que se sabe não houve nenhum revide físico, o que duvido muito que ficasse barato caso o mesmo acontecesse em ruas argentinas.   

É claro que o sentimento de adesão à equipe argentina tem muito a ver com a profunda irritação dos brasileiros com o papelão do time de Neymar & cia. Inevitável a comparação quanto à raça, a disciplina e o comprometimento de Messi & muchachos. A decepção com os nossos e o fator Messi permitiram que os hermanos fossem adotados em nome da causa sul-americana.

A consequência positiva do fiasco no Qatar é que força mudanças do lado de cá. Nada será como antes na Seleção, pelo menos nos próximos quatro anos. Nada de Daniel Alves, Tite e seus auxiliares meia-boca. Sob pressão, a milionária CBF pretende fazer uma imersão na ousadia, contratando um técnico estrangeiro, única saída possível a essa altura.

Lembrar que vexames semelhantes levaram a conquistas logo na Copa subsequente. Foi assim em 1966, que gestou o tri de 1970. Aconteceu o mesmo em 1990, quando o Brasil foi eliminado pela Argentina e partiu para o título de 1994, nos EUA. Em 1998, a “cara-branca” de Ronaldo e a derrota na França levou à vitoriosa campanha em 2002. Por tudo isso, 2026 promete boas notícias.

A vergonhosa (e parcial) arbitragem da grande final

O brasileiro Wilton Pereira Sampaio teve desastrosa atuação no jogo França x Inglaterra. Foi um vexame, de fato. Só que Wilton foi superado pelo polonês Szymon Marciniak, árbitro atrapalhado e medroso, que destoou do sensacional espetáculo que foi a decisão entre Argentina x França. Ficou muito abaixo do nível da partida e cometeu erros graves, que podem ter comprometido o resultado final.

Um dos mais sérios vacilos foi ter confirmado o terceiro gol dos argentinos. Segundo regra da Fifa, jogadores ou pessoas estranhas ao jogo não podem entrar em campo com a bola rolando. Os reservas entraram em campo para festejar o gol quando a bola foi rebatida pela defesa de dentro da trave.

Messi chegou fuzilando para o barbante e seus companheiros já estavam vários metros dentro do gramado comemorando. Uma irregularidade inaceitável numa final de Copa. Marciniak, porém, ignorou a invasão e deu o gol. Pode não ter visto, mas os auxiliares certamente perceberam.

Outra falha grave foi no lance final da prorrogação quando a França partia para um contra-ataque mortal, com dois atacantes contra um zagueiro (Otamendi), com o infernal Mbappé livre na esquerda. Um provável quarto gol francês liquidaria a decisão. Marniciak preferiu interromper a jogada, marcando falta sobre Kamavinga, sem aplicar a lei da vantagem.

Nem comentarei a malandragem de Di María cavando o pênalti do primeiro gol argentino porque Marciniak nunca apitou uma partida de Libertadores, não tem como entender as manhas de um jogador sul-americano.

Outro problema foi a complacência com a violência, principalmente dos argentinos. No primeiro tempo, Di María deu uma rasteira em Rabiot, mas não levou nem advertência verbal. Até Messi andou agarrando jogador pela camisa e ele deixou passar. Só deu amarelo para o carniceiro Paredes depois de muita reclamação dos franceses.

E foi fraco com o goleiro Martinez, que catimbou e retardou acintosamente as cobranças de penalidades. Pegava a bola, fingindo verificar se estava em condições e, em seguida, chutava para longe. Um truque para irritar os adversários, coisa de várzea. Marciniak só foi enérgico quando Dibu já havia feito isso três vezes. Uma vergonha. 

(Coluna publicada na edição do Bola desta terça-feira, 20)