A maravilhosa fábrica de mordomias da Fifa no Qatar

Cena 1 dos folguedos na Copa do Mundo. Ex-jogadores argentinos como Sorín, Crespo e Zanetti pulam na tribuna balançando suas camisas na torcida pelo time albiceleste. Cena 2: Ronaldo Nazário, Cafu, Roberto Carlos e outros ídolos do penta estão sentados na tribuna VIP da Fifa de terno assistindo à partida da seleção brasileira. O contraste entre as duas imagens não revela que, no final, os atletas consagrados desfrutam, todos, igualitariamente, de fabulosas mordomias da Fifa na Copa do Qatar-2022.

Pouco depois de assumir a Fifa em 2016, o presidente Gianni Infantino criou um programa chamado Legends, para transformar os ex-jogadores numa espécie de embaixadores do Mundial. Nesta quinta, 15, eles formaram oito times para disputar um torneio em grama sintética, numa arena montada no complexo Khalifa de Tênis e Squash, em Doha.

Mas, na maior parte do tempo, os ex-jogadores desfrutam de vida similar à dos cartolas da cúpula da Fifa. Ficam hospedados no Hotel Fairmont Doha, luxuoso e conhecido por sua construção em formato de ferradura, marcando o horizonte da cidade, chamado orgulhosamente pelos qataris de skyline. É o hotel mais exclusivo da capital. Os atletas são vistos em seu lobby ou nas redondezas atendendo compromissos comerciais próprios. Na última visita ao local, a reportagem viu o alemão Lothar Mathäus gravando para uma marca de refrigerantes japonesa na calçada em frente.

Além da fachada icônica do hotel, há quartos de tamanho suntuoso na descrição de hóspedes já acostumados a este tipo de instalação. As diárias, fora do período da Copa do Mundo, são de US$ 1.200 (R$ 6,3 mil). Durante o Mundial, é impossível se hospedar no local, que está todo reservado pela Fifa. Dentro do hotel, há o “Clube Fifa”, no qual dirigentes e jogadores têm direito a consumo de comida e bebidas (inclusive alcoólicas) liberadas. De lá, partem em transportes exclusivos para os jogos nos estádios.

O local onde Ronaldo e Roberto Carlos são filmados é a tribuna VVIP, onde ficam a cúpula da Fifa e chefes de Estado. Também há buffet liberado com bebidas disponíveis. E por que os ex-atletas argentinos aparecem torcendo em outro setor? Zanetti, Sorín e companheiros têm acesso a uma tribuna similar à de Ronaldo. Mas há um costume deles e de dirigentes do país vizinho de saírem deste local para irem para outro mais próximo da arquibancada para torcerem juntos. Não há obrigação de permanecerem no setor originalmente oferecido a eles.

Até porque não se trata de um trabalho, segundo a versão da Fifa: os ex-jogadores não são remunerados. A intenção da entidade com o programa é aproximar os ex-atletas de dirigentes, trazendo sua influência para as decisões sobre o futebol. É também uma forma de a federação internacional melhorar a própria imagem ao se associar a atletas consagrados. Não há um número certo de membros no Fifa Legends, há uma variação entre os que entram e saem. O torneio disputado em Doha contou com quase 100 ex-jogadores divididos pelos continentes, com dois times europeus e dois sul-americanos.

(Com informações do UOL)

Marrocos carnavaliza o futebol

POR GERSON NOGUEIRA

Andar por Doha é um desafio permanente quanto à localização de endereços, já comentei sobre isso aqui nas primeiras colunas sobre a Copa do Mundo. Existem ruas recém-criadas, porque a cidade vive em permanente construção. Nem o Google acha alguns lugares, nem os motoristas de uber conhecem. É preciso sair tateando para encontrar.

O povo é educado, gentil e prestativo quanto a informar e ajudar nas buscas diárias. Às vezes, esse périplo cansa um pouco, mas é um dos preços a pagar pelo privilégio de conhecer um país absolutamente exótico e diferente de todos os que já sediaram Copas do Mundo.

Por conta disso, ao tentar chegar aos vistosos cartões postais de Doha, o táxi tomou outro rumo e me conduziu por acidente à área próxima aos distritos onde vivem os operários dos estádios, gente que suou a camisa em situações inclementes para levantar as suntuosas arenas. Quase todos vivem em trailers estacionados ou em tendas ao ar livre.

Não é possível se aproximar ou entrevistar. Fica óbvio que os olhos da monarquia são tão eficientes quanto a segurança que as ruas oferecem, apesar da babel de povos. (A explicação se faz necessária em função de várias pautas sobre isso, sugeridas por leitores do blog).

Na véspera da semifinal Argentina x Croácia, um passeio pelo bairro de Souq Waqif permitiu descortinar um mundo bem diversificado. Ao contrário dos viadutos e espigões de aço e concreto, aqui é possível andar por vielas que oferecem cultura, aromas, artesanato, cantorias, sabores.

Em Souq Waqif tudo remete ao passado, às tradições catarianas, hindus e árabes. Um mercado gigantesco, maior que o nosso Ver-o-Peso, embora seja igualmente rico em surpresas para o visitante. Desde vendedores engalanados de chá de especiarias (com gosto de garapa) até artistas pintando em oficinas ao ar livre.

Nem todos aqui são nativos. Aliás, são poucos os nativos no Qatar – imigrantes são dois terços da população. Marroquinos, egípcios, etíopes, sauditas, nepaleses e paquistaneses são até bem comunicativos, mas esse fabuloso caldeirão ficou mais conectado por conta do futebol.

Em torno da saga de Marrocos reina hoje uma mistura profana, exposta ali em Waqif. Há um orgulho que invade as ruas, becos e até as modernas avenidas. Normalmente, o imigrante aqui é motorista de táxi, vigia, balconista, trabalhador braçal, mas todos pareciam estar à espera de um motivo para ir às ruas celebrar a alegria do futebol numa Copa que não lhes pertence – ingressos mais baratos custam 400 dólares.

Não festejam a Copa, mas cultuam a linda saga de Marrocos. A todo momento alguém surge com a bandeira vermelha estrelada de verde enrolada ao corpo. Vi isso em torno dos jogos de Marrocos, mas só entendi direito nos cortejos carnavalizados da noite de Souq Waqif.

E lá se vai mais um menino bom de bola

Bastaram seis jogos no time profissional para Endrick entrar na mira do Real Madrid, até ser negociado ontem por R$ 407 milhões. Um caminhão de dinheiro por um atleta de 16 anos, recém-saído das divisões de base e que pode ter o talento confirmado ou não. Só para se ter uma ideia da coisa, o valor desembolsado pelos espanhóis é superior ao dinheiro gasto por Ronaldo Nazário para adquirir o controle acionário do Cruzeiro.

Como a legislação impede que menores de idade joguem por times estrangeiros, Endrick só se apresentará no Santiago Bernabéu em julho de 2024. Até lá, ele seguirá jogando pelo Palmeiras.

Quando vejo negócios desse gênero, lembro que o futebol pode induzir a erros. Vários jogadores pelo mundo são descritos como craques e, com o passar do tempo, a previsão não se concretiza. Apesar disso, o Real resolveu arriscar, antecipando-se ao Manchester City.

Ao investir numa promessa como Endrick, o Real certamente já faz há algum tempo um acompanhamento minucioso do atacante. O desembolso de tanto dinheiro, sem retorno efetivo, só seria possível após um mínimo de segurança sobre as qualidades do atleta.

O fato é que o futebol profissional vem baixando a faixa etária dos jogadores. Cada vez mais, os grandes clubes buscam contratar o garoto e olham com desconfiança para o adolescente. Antigamente, a luta era para contratar jovens abaixo de 23 anos, limite máximo até o início da década de 2000, hoje uma idade considerada acima do ideal.

Os primeiros passos de Endrick foram promissores, mas sua imagem foi alavancada pela estupenda participação na última Copa São Paulo de juniores deste ano, quando marcou muitos gols e mostrou uma maturidade técnica rara em atletas iniciantes.

Seu cartel na base é impressionante: marcou 161 gols em 188 jogos. O tipo físico, forte e esguio, também ajuda. É capaz de disparar em velocidade, para desespero dos marcadores. Além disso, bem ao gosto do futebol europeu, muda de direção na corrida com extrema facilidade.  

É bom lembrar que, sem o êxito de Vinícius Jr. e Rodrygo, dificilmente a transação aconteceria. Ambos funcionam como selo de garantia. O Real sabe que o investimento em Endrick não é 100% seguro, mas confia na inesgotável usina brasileira de produzir grandes atacantes. 

(Coluna publicada na edição do Bola desta sexta-feira, 16)

Fifa aprova orçamento de 9,7 bilhões de dólares para investir no futebol até 2026

  • Orçamento para o ciclo 2023-2026 prevê US$ 9,7 bilhões investidos no futebol
  • Lançamento da Copa do Mundo de Clubes com 32 seleções para junho de 2025 entre vários princípios de calendário acordados
  • Regulamentos para Agentes de Futebol da Fifa são aprovados

O Conselho da Fifa se reuniu nesta sexta-feira antes da final da Copa do Mundo em Doha, Catar, que o presidente Gianni Infantino saudou como a “melhor de todos os tempos”, e adotou uma série de decisões importantes para o futuro do futebol. Embora confirmando que a receita no final do ano seria de US$ 7,5 bilhões – US$ 1 bilhão a mais do que o orçado – o Conselho aprovou o orçamento para o ciclo 2023-2026, que terá uma receita de US$ 11 bilhões, dos quais um aumento substancial proporção será destinada a investimentos em futebol, no valor de US$ 9,7 bilhões.

Em relação à Esquema de Desenvolvimento de Talentos (TDS) liderado por Arsène Wenger, chefe de Desenvolvimento Global do Futebol, o Conselho aprovou uma alocação de financiamento de US$ 200 milhões para cobrir o ciclo de vida operacional 2023-2026 desta iniciativa inovadora, que visa criar um legado sustentável por muito tempo desenvolvimento de jogadores a longo prazo, ajudando cada associação membro (MA) a atingir seu pleno potencial e, finalmente, dar uma chance a todos os talentos.

A atribuição de fundos às AG participantes no TDS seguirá uma abordagem feita à medida que terá em consideração as suas necessidades específicas. Estas AG beneficiarão ainda de um financiamento extra solidário, sujeito a critérios específicos.

Quaisquer fundos do TDS não alocados até 31 de dezembro de 2026 serão automaticamente transferidos para o Football Development Fund para fornecer suporte indefinido e exclusivo aos beneficiários do Fifa Forward 3.0.

Princípios do calendário internacional de jogos e competições endossadas

Vários princípios estratégicos importantes relacionados aos calendários e competições internacionais de futebol masculino e feminino foram endossados ​​pelo Conselho.

Para o futebol masculino, uma Copa do Mundo expandida com 32 times está programada para começar em junho de 2025 (após o adiamento do torneio original de 24 times planejado para 2021) e acontecerá a cada quatro anos. As janelas para o calendário internacional de partidas a partir de 2025 incluiriam uma janela estendida com quatro partidas no final de setembro e início de outubro para substituir as atuais duas janelas separadas em setembro e outubro, com as outras janelas (novembro, março e junho) inalteradas.

Para aumentar as possibilidades de times de diferentes confederações se enfrentarem, a Fifa lançaria torneios amistosos – “Fifa World Series” – que aconteceriam na janela de março nos anos pares. A decisão sobre a sede da Copa de 2030 também será tomada em 2024, com o regulamento da licitação sendo publicado no início do ano que vem.

Para o futebol feminino, a atual estrutura do calendário internacional de partidas permanecerá inalterada até 2025, com as sedes das Copas do Mundo Feminina 2027 e 2031 a serem decididas em 2024 e 2025, respectivamente. A criação de uma nova Copa do Mundo Feminina de Clubes, uma nova Copa do Mundo Feminina de Futsal e a expansão do torneio feminino dos Jogos Olímpicos de 12 para 16 times também foram endossadas.

Os princípios também incluem propostas para revisar o inventário de torneios juvenis da FIFA – incluindo torneios sub-17 anuais expandidos, tanto para meninos quanto para meninas.

Ao estabelecer os detalhes dos novos calendários de jogos internacionais, a devida consideração deve ser dada à saúde e bem-estar dos jogadores como um objetivo principal. Todos os princípios estratégicos chave acima serão detalhados em consulta com as partes interessadas relevantes nos próximos meses.

Marrocos, Emirados e Seychelles sediarão torneios

O Conselho também nomeou a Associação Marroquina de Futebol como anfitriã da Copa do Mundo de Clubes, que acontecerá de 1 a 11 de fevereiro de 2023. Também confirmou que a Copa do Mundo de Futebol de Praia será sediada pelo Associação de Futebol dos Emirados Árabes e a edição de 2025 pela Federação de Futebol de Seychelles.

Regulamentos para Agentes de Futebol aprovados

O Conselho da Fifa deu um passo importante para o estabelecimento de um sistema de transferência de futebol mais justo e transparente ao aprovar o Regulamento do Agente de Futebol, que busca introduzir padrões básicos de serviço para agentes de futebol e seus clientes, incluindo um sistema de licenciamento obrigatório, a proibição de representação múltipla para evitar conflitos de interesses e a introdução de um limite máximo de comissões, cujo objetivo é reforçar a estabilidade contratual, proteger a integridade do sistema de transferências e obter maior transparência financeira.

Emendas ao Código de Ética e Código Disciplinar

Como parte da política de tolerância zero contra todas as formas de violência de gênero e outras formas de violência, o Conselho também concordou em alterar o Código de Ética para garantir que, a partir de agora, todas as formas de abuso, assédio e exploração sexual não estão sujeitas a um prazo de prescrição para a ação penal.

Além disso, foram feitas alterações importantes no Código Disciplinar para fornecer maior proteção às vítimas de discriminação, fortalecer a luta contra a manipulação de jogos, confiar investigações de questões disciplinares específicas a especialistas independentes em integridade e ampliar o escopo de competência do Comitê Disciplinar da FIFA .

Esclarecimento do limite de mandato

O Conselho também confirmou por unanimidade seu acordo com a opinião do Comitê de Governança, Auditoria e Conformidade de que o período entre 2016 e 2019 não conta como mandato do atual presidente, que, portanto, está prestes a encerrar seu primeiro mandato.