Nas ondas da improvisação

POR GERSON NOGUEIRA

Os treinos da semana têm revelado uma tendência curiosa no Remo de Gerson Gusmão. Ele volta a escalar três volantes de origem no setor mais estratégico do time. Marciel deixa as obrigações puramente marcadoras e passa a ter funções mais criativas, uma improvisação que não chega a ser inédita porque já foi tentada por Paulo Bonamigo, sem grande sucesso.

É a típica situação de emergência. O Remo, que não tem um meia para chamar de seu desde Eduardo Ramos, já testou várias possibilidades por ali. Marco Antonio, Neto, Fernandinho e Marciel foram experimentados por Bonamigo. Nenhum funcionou bem.

Erick Flores aparece pelo centro do campo de vez em quando, dependendo dos humores do técnico de plantão e das circunstâncias da partida. Não que o jogador seja totalmente refratário à ideia de atuar pelo meio. Às vezes, atua e consegue produzir muito, como na fase inicial da Série B 2021, quando ensaiou uma parceria exitosa com Felipe Gedoz.

O problema que afeta Erick e os demais não-armadores utilizados na função é a própria ausência de regularidade do Remo, o time mais instável do campeonato. Quando uma equipe não se estabiliza no aspecto técnico tudo fica mais difícil, principalmente para quem chega com missões especiais.

Marciel, jogador que ficou praticamente dois meses em recuperação no Nasp do Remo, tem sido diligente e empenhado em contribuir para o time. Nem sempre consegue, como quase todos os demais unidos por esse esforço. A razão é a mesma: o time tem desajustes em todos os setores, mas é no meio que as fragilidades ficam escancaradas.

A criação é sempre um item decisivo no futebol. É raro ver um time funcionar a contento se não oferecer um mínimo de criatividade. Os melhores de uma competição se destacam justamente porque oferecem algo mais: a jogada pensada, os detalhes caprichados, o esmero que faz diferença.

Em geral, o sujeito que assume a persona de maestro é o mais qualificado. Sabe tratar a bola com uma intimidade que os demais não conseguem ter. É o cara dos lançamentos mais inspirados e das jogadas que surpreendem e furam os sistemas mais intrincados.

O Remo não tem um jogador com essas virtudes. Até tentou ter. Trouxe Albano e Anderson Paraíba. Comprou gato por lebre. Não eram os jogadores para suprir essa carência. Paraíba pode vir a contribuir para melhorar o funcionamento do setor, mas não demonstra inspiração para assumir o controle pleno da meia-cancha.

Caso seja confirmado com a camisa 10 para o jogo de segunda-feira contra o Ferroviário, Marciel terá que ser mais ágil que o habitual. Sua movimentação costuma ser cadenciada, o que pode ser fatal para quem tem a incumbência de fazer o time girar e avançar em velocidade.

Direto do blog campeão

“Fala Gerson, anota aí (parodiando o DataNogueira): Remo e Vitória passarão para a segunda fase, já os Botafogos, não. Minha secação está concentrada neles, pois acho que a brecha está no fracasso deles”.

Luiz Henrique Lima de Lima (Castanhal-PA)

A trajetória singular do técnico mais astucioso do país

Cuca cumpre uma trajetória única entre os técnicos do futebol brasileiro. Melhor dizendo: é um treinador que sabe conduzir a carreira naquele patamar restrito dos clubes endinheirados do país. É um Luxemburgo moderno, com menos títulos e mais sobriedade nas declarações.

Luxa soube administrar a própria imagem por cerca de duas décadas. Com resultados expressivos em campo, negociava sempre os melhores salários – e num momento de vacas magras do futebol no Brasil. A classe dos técnicos deve a ele a elevação das faixas salariais.

Foi o primeiro a ultrapassar o limite dos R$ 200 mil de salários. Antes dele, treinadores ganhavam mais fama e visibilidade do que dinheiro. Nem mesmo o grande Telê Santana era remunerado à altura de sua importância.

Voltemos a Cuca. Os consultores e marqueteiros chamariam o técnico atleticano de um “case” de sucesso, principalmente quanto à capacidade de manejar astuciosamente as tendências do mercado.

Quando comandou o Santos, decidiu pedir o boné antes de se desgastar. Consciente de que grandes feitos são rapidamente esquecidos, antecipou-se a uma desvalorização que viria na sequência do trabalho.

Agiu assim também no São Paulo e, de certa forma, no Botafogo. Sempre teve o cuidado de sair antes de ser despachado. Foi assim que conduziu magistralmente a passagem recente pelo Atlético-MG. No final da temporada, pediu as contas e alegou que precisava descansar.

Havia conseguido conquistas importantes. Sabia que tinha o nome definitivamente marcado na história do clube. Quando Turco Mohamed foi demitido, o retorno de Cuca surpreendeu quase ninguém.

Volta ainda mais valorizado, com salário que só fica abaixo da dupla portuguesa melhor remunerada do país (Abel Ferreira, R$ 2,6 milhões mensais no Palmeiras, e Vítor Pereira, R$ 2 milhões no Corinthians).

Entre os brazucas, Cuca é líder absoluto, com cerca de R$ 1,5 milhão de salários. No Galo, fica abaixo apenas da estrela da companhia. Hulk tem ganhos estimados em R$ 1,6 milhão.

Terá ainda direito a um bônus extra em caso de conquista do Campeonato Brasileiro e da Libertadores. Foi esse, embora ninguém confirme, o maior incentivo para que Cuca suspendesse o ano sabático e voltasse ao clube.

Até que novas conquistas o obriguem a sair de cena outra vez. 

(Coluna publicada na edição do Bola desta quinta-feira, 28)

Um comentário em “Nas ondas da improvisação

  1. Para mim ficou claro que Bonamigo não teve colaboração de jogadores chinelinhos, o que acarretou a demissão e a situação na tabela. Gusmão percebeu logo o problema e resolveu. O time melhorou o rendimento defensivo, mas ainda falta algo mais ao ataque. Com três volantes, suspeito que ainda será um jogo com pouca criatividade no meio. Vai ser um jogo difícil mais pelas carências do Remo que pela qualidade do Ferroviário, com respeito ao adversário. Que me perdoe o Ferroviário, mas o Remo não pode continuar reabilitando times debaixo da tabela, senão, vai parar lá.

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