Por Juca Ferreira
Se as coisas continuarem assim, sem uma força política alternativa representando a solução democrática para a crise, poderemos ter uma solução pela direita

Hoje eu acordei cedo e logo fui responder a mensagem de um amigo espanhol que acompanha nossa crise política com interesse e apreensão.
Ele tem chamado minha atenção de que está cada dia mais difícil entender o que está acontecendo desse lado do Atlântico.
Mandei para ele essa minha reflexão e gostaria de compartilhar com os amigos e companheiros que dividem a dor e a delícia de estar vivendo no Brasil nesse momento. Esta é uma conversa necessária entre nós, brasileiros que acreditam que a única saída para o Brasil é o caminho democrático.
Ele me perguntou como será a manifestação pró Bolsonaro que está planejada para acontecer no domingo:
– Estamos ansiosos, esperando domingo. Acho que eles ainda levarão muita gente para a rua…
A verdade é que ainda não estão derrotados, mas a decepção dos que acreditaram nas promessas e fakenews é enorme.
Bolsonaro e o governo estão perdendo apoio em todas as regiões do Brasil e em todas as classes sociais. E já é possível ver sintomas do trincamento na unidade política das elites. O desgaste é maior entre os mais pobres, por motivos óbvios. Instinto de sobrevivência.
Isso não significa que estejam derrotados.
É uma situação perigosa porque é comum, quando a extrema direita se vê em dificuldades, não aceitar a realidade (quando lhe é adversa) e costumam aprontar…
Mas é alentador para os que querem retomar o ambiente democrático e desejam por fim a essa aventura golpista que estamos vivendo desde o impeachment da presidenta legalmente eleita e que tanta dor tem trazido ao país.
É perceptível essa mudança do clima em todos os ambientes. A crise econômica está avançando velozmente e castigando todo mundo, principalmente os mais pobres. A fome voltou ao país. Muita gente voltando a morar nas ruas. A classe média vendo seu poder aquisitivo derretendo e sem futuro.
O governo não consegue fazer nada direito. Bolsonaro passa a ideia de incompetente e perigoso. Não é sem razão. Está tentando destruir nossas universidades e todo o sistema de educação do país. Está atacando a arte e a cultura e os direitos sociais conquistados desde Getúlio Vargas.
O governo já é considerado um desastre por grandes parcelas da população. Temos muito o que fazer. Não só resistir ao avanço do neoliberalismo e do fascismo.
É urgente recuperar a ideia de futuro, por exemplo. É preciso construir uma alternativa política para o país.
A conjuntura está em movimento e a cada dia que passa, com uma velocidade maior. O governo está se dissolvendo politicamente e o projeto neoliberal e autoritário está em curto circuito.
O país aos poucos está acordando do pesadelo…
No momento, sinto falta de mais política e da atuação dos partidos. O clima na sociedade está se modificando e, apesar de já estarmos saindo da perplexidade, o PT e demais partidos comprometidos com a democracia brasileira ainda estão sem a vitalidade e a agilidade que a crise nos impõe e que a sociedade está demandando.
De positivo, temos uma ação mais incisiva e mais eficiente dos nossos parlamentares (de esquerda, de centro esquerda e do centro-democrático) nas duas casas do Parlamento e em vários parlamentos estaduais e municipais. Alentador!
E em todo o território nacional, as manifestações individuais e coletivas vão ganhando forma e a resistência ao projeto neoliberal e autoritário já é um fato.
Se as coisas continuarem assim, sem uma força política alternativa representando a solução democrática para a crise, poderemos ter uma solução pela direita.
Em outras palavras, uma renovação do projeto golpista.
Uma hipótese que a direita trabalha nesse momento é o impedimento de Bolsonaro e toda a família e assim o vice, General Mourão, assumiria.
Tão direitista quanto Bolsonaro, só que mais inteligente e mais estruturado politicamente.
Esses generais da reserva que fazem parte do governo são o fim de safra, os frutos temporões dos porões da ditadura. São formados e pensam ainda dentro daquela dicotomia rígida do período da guerra fria e demonstram se identificar com a ditadura militar e prestam total apoio ao projeto antidemocrático, contra nossa soberania e marcadamente antipopular.
O mundo evoluiu, mas eles ficaram datados, com o prazo de validade vencido. São uma reserva “com cheiro de naftalina” dessa onda conservadora e da extrema direita que neste momento está grassando em várias partes do mundo e que se manifesta também por aqui.
Não me parece que eles representem as Forças Armadas. Mas claro, influenciam e representam uma postura que tem base nos quartéis.
A outra alternativa visível que a direita está articulando é o que eles chamam de “parlamentarismo informal”. Seria transformar Bolsonaro numa espécie de rainha da Inglaterra, reina mas não governa, e transfeririam todo o poder de mando para o Congresso e o deputado Rodrigo Maia do DEM, presidente da Câmara, passa a ser a referência de poder.
As duas alternativas são péssimas. Em ambas, a crise política continuaria, a economia continuaria em queda. Sem falar que é o mesmo projeto de Temer e Bolsonaro para o país.
E, além disso, essa segunda “alternativa” é um passo adiante na desestruturação do Estado nacional. Como se as leis e a Constituição não valesse para nada.
A Constituição vem sendo pisada e rasgada por todos esses golpistas deste o impeachment. Cada dia, um rasga uma página da nossa Constituição cidadã e assim vão levando o país para o buraco da incerteza.
Tudo isso vem tendo o apoio das nossas elites econômicas, o que é terrível! Pura usura e pragmatismo predatório dos banqueiros, dos grandes empresários da indústria, do setor de serviços e dos donos do agronegócio.
Está faltando no Brasil nesse momento um projeto democrático e popular, que dispute politicamente com o projeto das nossas elites e que articule e aglutine uma alternativa de todo o campo de centro-esquerda, esquerda e centro capaz de unificar a sociedade para o país retomar o caminho da democracia e do desenvolvimento.
As condições sociais estão demandando o surgimento dessa alternativa de retomada do Estado de direito e o fim da aventura golpista que começou com o impeachment da presidenta eleita e que ninguém sabe quando termina.
Essa ausência é muito perigosa para o futuro do país e para nossa democracia. Essa tibiez da resistência democrática passa a sensação para a sociedade de que estamos sem saída.
O que não é verdade.
Curtir isso:
Curtir Carregando...