Plateias em desencanto

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POR GERSON NOGUEIRA

É fato notório que o público vem minguando gradativamente nos estádios paraenses. O impacto maior se registra sobre os números da dupla Re-Pa, cuja redução se acentuou nos últimos dez anos. Detentora de plateias admiradas no país inteiro, com imagens que refletiam a paixão das duas grandes torcidas, Belém raramente consegue hoje bilheterias acima de 20 mil pagantes.

Quando um time põe 35 mil pagantes, como o Remo diante do Sampaio Corrêa, há uma semana, é motivo de êxtase, foguetório e fanfarras. Não só os dirigentes se rejubilam. Por ser tão pouco frequente, o feito ganha amplo destaque e vira manchete de jornal.

Mas, para cada lotação máxima, o Mangueirão registra uma série constrangedora de fiascos, como o de sexta-feira, para Papão x América-MG – público de 3.481 pagantes. Não por acaso, na temporada, os velhos rivais registram anêmicos 27% (cada um) de ocupação dos lugares à venda. Pouco mais da metade da lotação possível nos estádios.

Em termos de bilheteria, a situação fica ainda mais clara: a média do Leão na temporada é pouco acima de 11 mil pagantes. A do Papão fica em 8 mil. Nos campeonatos brasileiros, o Remo tem média superior a 12 mil e o PSC fica um pouco acima de 5 mil espectadores.

Quando a questão vem à baila de maneira desapaixonada, sem clubismos ou discussões de arquibancada, descobre-se que há um imenso fosso a separar hoje o produto oferecido pelos clubes das expectativas do cliente final, o torcedor. Os dirigentes não gostam dessa conclusão, mas os números indicam que o preço cobrado pelo futebol está fora da realidade socioeconômica da clientela.

Esse descompasso tem a ver diretamente com a má qualidade do jogo. Os times têm empobrecido tecnicamente, há carência de ídolos e pouca motivação pelas disputas interestaduais e nacionais. Frequentes dissabores na Copa Verde e nos Brasileiros derrubam ao rés do chão até o fanatismo mais primário. Não há paixão que resista a tanta desilusão.

No plano social, é preciso entender que ao fixar o preço do ingresso de arquibancada a R$ 30,00 os clubes estão naturalmente tirando de cena o torcedor mais humilde, de parcos recursos. A definição de preços é quase sempre baseada no raciocínio cartesiano de que o futebol é caro demais para permitir a cobrança de bilhetes populares.

A questão a ser desdobrada é mais complexa: têm os clubes do Pará um repertório qualificado a oferecer para plateias abonadas e, obviamente, mais exigentes¿ Óbvio que não. As equipes padecem de crônica decadência, buscam reforços questionáveis e não mantêm regularidade nas competições. Por isso, há o afastamento deliberado do torcedor mais elitizado e a exclusão dos velhos “arquibaldos”.

Em meio a isso, persistem de pé fatores que também influem na queda de frequência nos estádios. Insegurança, carência de transporte urbano, desconforto nas instalações dos estádios, horários inadequados e a concorrência sempre forte das transmissões ao vivo pela TV.

Para atenuar esse déficit crescente, os clubes do mundo inteiro investem em marketing, comercialização de itens diversos e programas de sócio-torcedor. Nos centros mais desenvolvidos, o ST prosperou e se tornou um grande suporte na receita dos clubes. Inter, Palmeiras, Grêmio, S. Paulo e Corinthians são os que melhor se organizaram. Por isso, faturam mais.

Os demais clubes patinam ainda nessa área e a imensa maioria, como os grandes de Belém, termina por ficar no meio-termo, sem consolidar o ST e sem atrair o torcedor comum. Pior ainda: avançam na perigosa rota da elitização de suas torcidas ao inflacionar preços destinados a forçar a associação aos programas de fidelização. De olho no naco maior, podem acabar ficando sem nenhum dos dois segmentos.

O tema é vasto e requer debate mais aprofundado, que deveria ser proposto pelos próprios clubes, maiores interessados na busca de soluções.

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Neymar brilha no campeonato mais garapa da Europa

A cada fim de semana, a mídia esportiva brasileira se enche de orgulho varonil ao noticiar novas e fantásticas diabruras de Neymar pelo PSG. A maioria das pessoas não leva muito em conta o fato de que as façanhas do astro se desenrolam num campeonato tecnicamente fraco, bastante inferior às competições dos centros mais badalados da Europa – Inglaterra, Espanha, Itália e Alemanha.

A baixa competitividade do torneio permitirá a Neymar um desfile tranquilo de suas inegáveis qualidades, mas tende a limitar sua evolução como jogador de ponta, o que é ruim para ele e péssimo para a Seleção Brasileira.

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Bola na Torre

O programa vai ar às 21h, na RBATV, com apresentação de Guilherme Guerreiro e participações de Giuseppe Tommaso e deste escriba baionense. Sorteios, gols e comentários sobre os jogos da rodada.

(Coluna publicada no Bola deste domingo, 10) 

11 comentários em “Plateias em desencanto

  1. Menos mal para o torcedor do PSC, que vê seu time, ainda que não bem, na série B.
    Deveria prestigiar mais, em que pese todos esses fatores que afastam o público.

    Ruim mesmo está para nós, azulinos, que nem podemos acompanhar o time no restante do ano.

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  2. Bom dia nobre amigo colunista, um dia me lembrarei que tive o privilégio de ler as pontuais análises de Gerson Nogueira, como diria o saudoso Chico Science “de tiro certeiro como bala que já cheira a sangue”, sem medo de falar a verdade e proporcionando aos leitores azulinos e bicolores a oportunidade de ver o bom jornalismo. Gerson, o último jogo do Remo que fui foi ano passado um Remo x Salgueiro no mangueirão, salvo engano foi 1 a 1, talvez tenha sido o único jogo que fui ano passado, ora, hoje tenho a comodidade da televisão, banheiro ao lado, suco e petisco, e se o Remo perder não preciso voltar muito mordido pra casa pois já estou em casa, mas nem é pelo fator comodidade que parei de ir aos jogos, mas sim por não ser conivente com gestões amadoras, o máximo que ainda faço é comprar as camisas do time e olhe lá, agora vamos fazer as contas: ingresso em média 30 reais, se for de carro pode colocar uns 20 reais de gasolina, se for pagar estacionamento deve estar uns 10 reais (ta isso?), não vou passar 2/3 horas sem beber e comer nada la no mangueirão, bota aí mais uns 15 reais, no total (e indo sozinho) lá se vão 75 reais pra assistir jackinha e leo rosa, aaaaa não, não dá. Pensando nisso me lembro que alguma vez devo ter te.falado que o Clube do Remo deveria credenciar cada vendedor ambulante que andasse pelos arredores do estádio em dias de jogos colocando um selo e padrão de vendas do Clube do Remo, tirava 10/15% do lucro para o Clube, aumentava o valor e a qualidade do produto e todo mundo sairia ganhando, não sei o porque de não fazerem isso, talvez seja muito difícil, vai entender, se bem que não estabelecem nem uma política salarial no clube, melhor eu me calar. Grande abraço.

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  3. Perfeito, Gerson. Gostaria apenas que fosse traçado um paralelo com outras praças, pois tenho impressão que o afastamento do torcedor vai de norte a sul, já que apesar de tudo nossos públicos ainda têm destaque nos rankings de competições nacionais. Outra, sabemos que futebol e cerveja guardam relação estreita. Seria a proibição da gelada um fator secundário no afastamento do torcedor? Mas o principal motivo sem dúvida é o aspecto técnico, onde a ruindade impera.

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  4. Nesse jogo do Papão contra o América MG fui ao mangueirão, cheguei beirando as 00:30 em casa, tudo isso pra ver Anselmo e companhia, conclusão: com esse time não vou mais ao estádio.

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  5. Estive pela última vez no obsoleto Mangueirão, em maio passado, para assistir à final da Copa Verde/2017. Jogo programado para 20h, saí de casa às 18h, Depois de me ver em verdadeiro rally no trânsito da omissa SEMOB, consegui chegar ao meu assento aos 25 minutos do 1o tempo, com o Paysandú já ganhando de 1 a 0. Premiado com a vexatória perda do título, cheguei em casa cerca de duas horas depois. De lá para cá, não mais voltei ao Mangueirão, pois a logística e o espetáculo oferecidos não justificam o mínimo sacrifício. É melhor gastar esse tempo no canal fechado do bar da esquina, eventualmente com ar-condicionado, e torrar o valor do ingresso em cervejas e tiragostos.

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  6. O Mangueirão é a cara elitista de quem o projetou, misturada à incompetência crônica do governo que o administra. Então, se é pra sofrer, melhor encostar no bar pra ver o jogo e gastar com menos culpa os R$30,00.
    Encômios à torcida azulina pelo estoicismo de sofrer pra ter acesso a arena do espetáculo e sofrer mais ainda com o aquilo que vê e que muitos ousam chamar de futebol.
    Por isso, mesmo aplaudindo o primoroso texto, ainda acho que a torcida remista merece elogios e salva a fama paraense de ser adubada pela paixão futebolística

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  7. Ok Gerson. Excelente análise da situação do futebol paraense, não se admire se o remo não ficar de fora de competições no ano de 2018. O “Magnata” já abandonou o barco e as dividas vão começar a pipocar. O Paysandu ainda tem como se manter como o ST e a exploração da marca Lobo.
    Mudando de assunto, sacanagem foi a derrota do Sampaio rebaixando o Moto Clube.

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  8. Como remista, vou direcionar-me ao Clube do Remo, mas muito do que exponho serve também ao Paysandu.

    A experiência deste ano é didática. Josué Teixeira indicou, a diretoria contratou e o resultado foi um time sem identidade, sem coletividade, sem expressão. Em uma única palavra, sem resultados. O modelo de o treinador contratado indicar jogadores tem-se mostrado improdutivo, incorreto, incoerente. É preciso mudar este modelo. Remo e Paysandu necessitam, com urgência, de um gestor de futebol. O atual modo de proceder para a escolha do dirigente de futebol é um fracasso. É inteligente contar com profissionais com expertise no futebol. Para além de treinadores e jogadores, é preciso encontrar soluções regionais para pensar o futebol em longo prazo. O Corinthians e o Santos, truncando em dois exemplos, têm ex-jogadores que assumem o papel de coordenar o departamento de futebol, cada qual no próprio clube, com vistas a realizar investimentos, revelar craques e montar boas equipes. Destaque-se o Santos, que revelou Robinho, Elano, Ganso, Diego, Gabigol e fez bons negócios e montou boas onzenas a partir de boas apostas em atletas nas divisões de base. O Corinthians não investiu sempre, não necessariamente, em promessas da própria base, mas sondando bons valores pelo Brasil e apostando em boas soluções vindas de jogadores que não foram relativamente caros para o clube e da base, como Paulinho, Cássio, Rodriguinho e Jô. O exemplo dá o tom das próximas apostas azulinas: jogadores locais e da base, desde que tratados com seriedade e profissionalismo. O Remo está preparado para o “novo”? O que se chamaria de novo para o Remo não é bem uma novidade o Brasil e no mundo, mas seria uma bem vinda mudança de postura do clube. O modelo amador está esgotado há muito tempo e é preciso atualizar o modo de gerir o futebol azulino para um modelo sério, menos aventureiro e mais responsável, que conte com critérios técnicos, financeiros e um projeto de longo prazo para deslanchar o futebol local porque, definitivamente, não é mais possível esperar que jogadores veteranos solucionem velhos problemas táticos, que têm muito mais a ver com a organização estrutural e administrativa do que propriamente com capacidade de técnicos e jogadores em desenvolver uma equipe para entrar em campo. A evidência aponta para o abandono do amadorismo e a adoção do profissionalismo como forma de superar dificuldades históricas para ter-se uma equipe realmente competitiva e que dê ao torcedor a resposta que este espera (e merece) do clube, o futebol bem administrado e valorizado.

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