O peso simbólico do 7 a 1

Por Luiz Guilherme Piva

Sempre se usou a expressão “dar de dez a zero” pra dizer que alguma coisa é muito melhor do que outra.

Não melhor. Muuuuuiiito melhor.

A comida lá de casa dá de dez a zero na de qualquer restaurante. A fulana dá de dez a zero na sicrana. Paris? que que isso! Londres dá de dez a zero. Empatou, mas o Palmeiras deu de dez a zero no Corinthians.

Havia já até certa intimidade: “isso dá de dez naquilo”, etc.

Mas, desde a Copa do Mundo, o léxico mudou. Só um eremita segue usando “dez a zero”.

Agora a expressão é “sete a um”.

A comida do restaurante dá de sete a um na lá de casa. Sicrana dá de sete a um na fulana. Paris dá de sete a um em Londres. Empatou, mas o Palmeiras deu de sete a um no Corinthians (a verdade é imutável).

Nas peladinhas, nos bares, nos artigos, nas piadas, nas mentiras, nos casos, em tudo, a expressão que se usa quando se quer comparar duas coisas de qualidade muito diferente é “sete a um”. Não demora e virá a intimidade: “dá de sete” – pronto, já se entenderá que é “a um”.

E mais. O “dez a zero” não existia em tradução literal em nenhuma língua. Com o “sete a um”, é diferente. Talvez pela internacionalização, pelas redes sociais ou pela ampla transmissão ao vivo do jogo que a originou, a expressão ganhou o mundo em todas as línguas: “seven-one”, “siete a uno”, “sept à un”, “sette a uno”. Todas se referem a uma comparação humilhantemente desigual.

Quer dizer, em quase todas as línguas. Na Alemanha se usa uma forma onomatopeica: “quá-quá-quá!”. Sempre seguida de um coro igual: “quá-quá-quá!”. Se houver alguma camisa amarela por perto, eles a apontam para reforçar a expressão, embora todos entendam imediatamente do que se trata.

Não é o caso de acharmos ruim. De certa forma, estamos ajudando a aprimorar idiomas no mundo todo. Dá até certo orgulho.

Eu mesmo já adotei e estou usando.

Embora, para mim, em termos sonoros, o “dez a zero” dê de dez a zero no “sete a um”.

Quer dizer, de sete a um.

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Luiz Guilherme Piva publicou “Eram todos camisa dez” (Editora Iluminuras)

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