O mérito. Ou não

Por Janio de Freitas (Folha de S. Paulo/DIÁRIO)

O chamado julgamento do mensalão remexeu com mais mentes e corações do que apenas os dos réus. Encerradas as sessões julgadoras, as ideias e posições continuam dando cambalhotas que fazem as surpresas do governo com o ministro Luiz Fux parecerem insignificâncias. Em entrevista sem razão de ser – entrevista-vitrine, digamos – entre o pedido de prisão dos condenados e sua decisão a respeito, o ministro Joaquim Barbosa encaixou uma revelação perturbadora: é contrário ao sistema de promoção de juízes por mérito. O fundamento dessa originalidade: “A politicagem que os juízes de primeiro grau são forçados a exercer para conseguir uma promoção é excruciante”.

E o mérito é o culpado? Ou é ele o vitimado? O que o ministro diz ser o usual para a promoção dos juízes já é a exclusão do mérito. Logo, sua proposta é excluir o que está excluído. Mas, sendo “a politicagem” um método que “denota violação ao princípio da moralidade”, esse método é que deveria acabar. Para restabelecer-se, e não para excluir, o valor do mérito. E ver-se o ministro Joaquim Barbosa satisfeito com as promoções por merecimento, e não por picaretagem social e política.

Mas reconheço a originalidade da insurgência contra o mérito exposta pelo presidente do Supremo Tribunal Federal. Pode até servir para me dar uma sobrevida aqui, considerada a influência que outras atitudes originais do ministro lhe conferiram. Mas é verdade que nunca li, ouvi ou imaginei uma condenação do mérito. Ainda mais em nome da Justiça.

Já estou refeito do traumatismo mental e moral sofrido quando dei literalmente de cara, sem prévio aviso (por favor, não confundir com aviso prévio), com as alegações do procurador-geral Roberto Gurgel, no pedido de prisão dos condenados pelo mensalão.

Ele considerou necessária a “definitividade” (ai! dói ainda) às condenações, com a consequente impossibilidade de recurso contra o que é dado como definitivo. Sem as prisões imediatas e com os recursos previstos, o procurador-geral considera, e gostaria de impedir, que será “excessivamente longo” o tempo até a conclusão da ação penal 470, com os condenados na prisão. Os recursos, se ocorrerem, não serão atos judiciais inventados pelos advogados de defesa para os réus do mensalão. Seu uso está autorizado pela Constituição, pela legislação específica e previsto pelos regimentos do Judiciário.

No caso, ao Supremo Tribunal Federal compete considerá-los ou rejeitá-los. Manobras para impedir que ocorram são atos contra a Constituição, a legislação específica e os regimentos. São, portanto, contra a República e seu sistema judiciário. Para cuja defesa existe, entre outros fins, e como o título indica, o cargo de procurador-geral da República.

O recém-empossado ministro Teori Zavascki considera que “o excesso de exposição não colabora para as boas decisões” do Supremo. Talvez se dê o oposto, às vezes. Como pareceu se dar nos julgamentos das células-tronco e das terras indígenas de Roraima, por exemplo.

Para a aparente maioria, foram boas decisões. Mas o que importa na opinião autorizada do ministro é trazer, implícita, a ideia de que as decisões do Supremo são suscetíveis, por contenção ou por exibicionismo, de influenciar-se pela exposição aos cidadãos em geral. Eu é que não dou exemplos de.

3 comentários em “O mérito. Ou não

  1. Falou e disse o grande advogado e defensor dos preceitos constitucionais aplicáveis aos arrolados na ação penal 470.

    RRamos

  2. De fato, o Fux “surpreendeu” o governo. Certos petistas, os lulos, dizem que o termo correto seria traiu.

    O Ministro Joaquim tem todo o direito de expressar sua opinião, mas quanto à promoção por mérito, também acho que ele foi, no mínimo, infeliz no que defendeu.

    Agora, a mídia é mesmo muito volúvel. Quer por que quer os pronunciamentos, e quando os Ministros os fazem, diz que eles querem e gostam de holofotes, da vitrine.

    De minha parte eu preferiria que os ministros se expusessem somente durante as transmissões dos julgamentos, no estrito cumprimento de suas respectivas missões, mas como não é ilegal que eles deem entrevistas, só me cabe assisti-las. Pelo menos posso fazer minha própria avaliação quanto à procedência ou improcedência do que dizem. Não ficando refém do que dizem a Carta Capital ou a Veja, ou o Reinaldo Azevedo ou o Paulo Henrique Amorim, isso para citar só algumas fontes das mídias rivais.

    Interessante que todos gostaram, inclusive a mídia, do comportamento do Ministro Joaquim aquando do arranca-rabo em que ele se envolveu, ao vivo, com o Ministro Gilmar Mendes.

    Numa palavra, “dependendo da hora” a superexposição dos Ministros pode ser boa ou ruim para alguns.

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