Cego, rei dos bordões se refugia em Goiás

Por Ricardo Zanei

“Ele é cruel, muito cruel”. A frase nasceu por acaso e é apenas uma das tantas que marcaram a carreira de Januário de Oliveira. Se a narração de futebol na TV, até hoje, é permeada por bordões, ele é um dos “culpados”. “Cruel”, “sinistro”, “Super Ézio” e “tá lá um corpo estendido no chão” são apenas alguns exemplos das tiradas desse gaúcho de Alegrete. Aos 70 anos e afastado das transmissões desde 1998, ele continua acompanhando o futebol, mas, hoje, por causa do diabetes e a visão bem prejudicada, apenas de casa. Cego do olho direito, ele agora tem dificuldades para enxergar do olho esquerdo. Isso não impede que Januário perca o bom humor: com uma memória afiada, ele relembra os grandes momentos da carreira de sucesso. E emociona.

Em entrevista por telefone, Januário, hoje morador de Goiânia, falou sobre o caminho que o levou ao futebol. Fã da modalidade, ele começou sua trajetória fazendo rádio-novela, em 1963. Foram seis meses como ator antes de pintar uma brecha no esporte, na rádio Cultura de Bagé. Tinha início, ali, quase 40 anos ligados ao mundo da bola. O namoro com o rádio foi até meados dos anos 80, quando foi levado por Sérgio Noronha para a TV Educativa, no Rio de Janeiro. Em 1990, foi para a TV Bandeirantes, emissora na qual trabalhou até 1998, quando a doença o obrigou a se aposentar.

Os bordões
“É engraçado, nunca imaginei antecipadamente o que eu ia usar. Nunca pensei ‘essa frase é boa e posso dizer isso em uma transmissão’. Tudo aconteceu no estalo”, disse Januário. Foi assim, de sopetão, que surgiram frases ainda hoje marcantes. “Vi os homens da maca entrando em campo e disse ‘olha aí o primeiro carreto da tarde’. O pessoal achou engraçado. Aí tinha um jogador caído, e falei ‘tá lá um corpo estendido no chão’. Isso também ficou famoso, virou até música, uma do Gabriel, o Pensador, outra do João Bosco.”

Cada bordão surgiu de maneira curiosa. “Eu estava transmitindo um Flamengo e Sport, e o Mozer, zagueiro, recuou uma bola para o Gilmar. A bola passou por entre as pernas dele, devagarinho. Foi um frango fantástico, a bola indo fraquinha para o fundo do gol. E eu falei ‘Gilmar, sinistro, muito sinistro’.”

E o cruel? “Foi em um jogo do Dener no Vasco, em São Januário. Ele fez quatro gols e deu passe para outro. No quarto gol, ele pegou uma bola no campo do Vasco, deve ter driblado uns oito jogadores, teve gente que ele driblou duas vezes. Aí eu comecei a narrar ‘maravilhoso, fantástico, grandioso’, fui usando todos os adjetivos, mas acabaram os adjetivos, a língua portuguesa encolheu pra mim. Aí veio um Dener foi ‘cruel, muito cruel’. E assim nasceu”, lembrou Januário.

O narrador criou ainda “sobrenomes” para alguns jogadores, como Charles “Guerreiro” e Valdeir “The Flash”. “Ele era só Charles. Quando ele foi para o Flamengo, tinha o Charles, atacante, aquele que jogou no Bahia e no Boca Juniors. Aí virou ‘Charles segundo’. Como o espírito dele era de guerreiro, comecei a chamá-lo de Guerreiro. Até quando o Parreira o convocou para a seleção, ele falou ‘Charles Guerreiro’, do Flamengo. Ele até adicionou o “Guerreiro” no nome dele”, disse. “O Valdeir… Passava a série na TV Globo, e ele chegou correndo que nem um louco no Botafogo. Eu o chamei de ‘The Flash’. Hoje, até o filho dele o chama de ‘The Flash’.”

E quais os bordões mais famosos? “A gente ouve até hoje o ‘tá lá um corpo estendido no chão’. Para a torcida do Fluminense, o que mais marcou foi o Super Ézio.

Super Ézio, capítulo à parte
O único bordão “sugerido”para Januário veio em um almoço com um amigo na semana antes de um clássico entre Botafogo e Fluminense. Curiosamente, se tornou um dos mais clássicos da carreira do narrador. “O Fluminense era muito ruim na década de 90, mas ainda assim o Ézio era artilheiro do Carioca. Eu estava almoçando com um amigo flamenguista, e disse para ele que tinha que ser herói, como o Ézio, para fazer gol pelo Flu. Ele falou ‘herói, não, super herói’. Aí, dois minutos depois, abre a porta do restaurante e entra o Ézio. Ficamos ali, brincando com ele, com o lance de super herói.

Chegou o clássico, e o Fluminense fez 1 a 0 com Ézio. Em seguida, o atacante voltou a marcar, e Januário emendou um “Ézio, o herói tricolor, 2 a 0, nasce o super herói tricolor, nasce o Super Ézio”. “A torcida gostou. A repercussão foi enorme e, sempre que falavam com ele, falavam de Super Ézio.”

Começava uma amizade que durou até a morte do artilheiro, em novembro do ano passado. “Depois de um Atlético-MG x Fluminense, ele se despediu do futebol, mas não fez alarde, não falou para ninguém. Eu apresentava um programa de debates na TV Educativa e, no fim do programa, estava lá o Ézio com a mãe, a irmã, o cunhado, a noiva, enfim, ele tinha trazido a família inteira dele do Espírito Santo para assistir ao último jogo dele como profissional. Ele levou todo mundo na TV só para me apresentar e me dar a camisa que ele tinha acabado de usar, que eu guardo até hoje com muito carinho. Nessa noite, ele me deu o celular, o telefone da casa dele, e a partir daí não perdemos mais o contato. Mesmo meses antes de ele falecer, a gente se falava. Nos tornamos grandes amigos.”

A doença
“Eu me aposentei em 1998, por causa do diabetes, que começou a prejudicar a minha visão e não permitiu que eu trabalhasse mais. Fiz duas cirurgias, perdi uma das vistas na primeira. Tive retinopatia diabética, mas, quando operei, já era muito tarde. Fiz a segunda cirurgia e, felizmente, a vista esquerda ainda não estava tão comprometida. Ainda vejo alguma coisa, mas não dá para noticiar. Fiz Copas do Mundo, fiz Olimpíadas, adorava os Campeonatos Brasileiros, sempre os achei apaixonantes. Foi muito bom enquanto durou. Tudo valeu a pena”, disse o narrador.

Januário brinca com os boatos que correm na internet. Fuçando na rede, é possível encontrar notícias sobre a morte do narrador ou ainda que ele teve as pernas amputadas. “Já disseram muita coisa por aí, que eu morri, que amputaram as minhas pernas, que eu estava totalmente cego. Até agora, o máximo que amputei são as unhas, que eu corto todas as semanas”. Mesmo longe dos gramados, é possível dizer que “taí o que você queria” e que “é disso, Januário, é disso que o povo gosta”. E, parafraseando mais uma vez o eterno criador de bordões, “acabou o milho, acabou a pipoca, fim de papo”.

Qual a maior torcida da internet?

Remo e Paissandu, os dois titãs paraenses, estão se alternando na liderança da enquete nacional UOL para saber qual é a maior torcida da internet. Desde que a pesquisa foi lançada, os dois clubes têm se destacado, mas assumiram a ponta desde a manhã desta quinta-feira. Quando este post foi escrito, o Remo liderava com 50.984 votos e o Paissandu vinha em segundo, com 50.879. Em terceiro, o todo-poderoso Corinthians, campeão brasileiro, com 32.185. O Palmeiras está em quarto, com 25.558. O Flamengo, clube mais popular do país, é apenas o sétimo, com 14.747. http://esporte.uol.com.br/infografico/2012/05/18/qual-e-a-maior-torcida-do-brasil.htm

Uma aula de marketing

Como transformar limão em limonada? Tite ensinou como se faz. Expulso aos 11 minutos do segundo tempo, por reclamação, na vitória do Corinthians por 1 a 0 sobre o Vasco, que garantiu a vaga na semifinal da Libertadores, ele resolveu ir parar nos braços do povo. Nada de ir para camarote ou cabine assistir ao restante da partida com rádio de comunicação para falar com os auxiliares. Cercado por seguranças e auxiliares, o técnico foi para o alambrado, acompanhar o resto do jogo ao lado dos torcedores, que podiam ouvir a conversa do treinador com seus comandados. Uma festa, afinal torcedor adora essas coisas.

Grudado no alambrado, Tite virou atração. Câmeras e microfones se voltaram para o canto do gramado, ele estava na linha da bandeira de escanteio do gol que o Corinthians atacou no etapa final. Policiais se aproximaram para aumentar a segurança do treinador e aumentar a aglomeração. Quando Fábio Mahseradjian, o preparador físico, correu para saber quem entraria na sequência, Tite avisou: “coloca o Liedson e tira o Emerson”. “Isso, Tite, é isso mesmo”, gritou o torcedor quase ao seu lado. Para ver o jogo melhor, Tite resolveu subir os degraus e ficar quase no primeiro lance das arquibancadas. Foi dali que ele comemorou o gol de Paulinho. Ao seu lado, o gerente de futebol e ex-jogador Edu o abraçou forte. Uma noite de consagração marqueteira para o técnico que adora falar difícil.

Sucesso da “La U” vem da base

Por Rafael Reis

O time que se tornou sensação do futebol da América do Sul no segundo semestre do ano passado e que está a um 0 a 0 de ficar entre os quatro melhores da Libertadores honra o nome que carrega. A Universidad de Chile é um centro de formação e capacitação de novos talentos. A equipe que hoje recebe o Libertad e defende a vantagem obtida graças ao empate por 1 a 1 no Paraguai para ir às semifinais da competição sul-americana é a mais jovem das quartas de final. Os 15 jogadores utilizados como titulares pelo técnico argentino Jorge Sampaoli na fase final da Libertadores têm uma média de 25,1 anos. É bem menos do que os 26,8 anos do Santos, dos garotos Neymar e Ganso, clube que mais se aproxima da juventude dos chilenos.

Sem condições financeiras para bater de frente com times do Brasil, e até mesmo da Argentina, a Universidade de Chile adotou duas receitas para tentar brigar com os bambambãs do continente. A primeira foi valorizar a juventude no time adulto, tanto com a promoção de jogadores das categorias de base, quanto com a busca de talentos de clubes pequenos. O lateral Mena, um dos principais nomes da equipe, chegou aos 20 anos do Santiago Wanderers. O artilheiro Junior Fernandes, 23, foi contratado do Palestino para se desenvolver em Santiago.

O orçamento destinado às categorias de base subiu 33,3% nesta temporada, turbinado pela venda para o Napoli de Eduardo Vargas, destaque na conquista da Sul-Americana do ano passado. Dos 15 nomes mais utilizados pela Universidad de Chile na Libertadores, cinco saíram dos times inferiores. A aposta é Angelo Henríquez, 18, com impressionantes 12 gols em 18 jogos em menos de um ano como profissional –marcou quatro vezes na Libertadores.

O camisa 7 pode ser visto no Manchester United já a partir do segundo semestre. O clube possui a prioridade de compra do jogador e tem até 2014 para pagar € 4 milhões e levá-lo a Old Trafford. Além da valorização dos jovens, o clube importou os conceitos de controle da posse de bola, futebol ofensivo e trocas constantes de posição utilizados pelo Barcelona.

Sampaoli, admirador confesso do trabalho de Marcelo Bielsa, técnico do Athletic Bilbao e um dos mentores de Pep Guardiola, foi o responsável por fazer a adaptação. Com ele no banco de reservas, “La U” virou referência de futebol bonito, ganhou o primeiro título internacional da história e foi protagonista de placares surpreendentes. Nas oitavas de final da Libertadores, esteve à beira da eliminação depois de ser goleado por 4 a 1 pelo Deportivo Quito. Retribuiu o vexame com 6 a 0 no jogo de volta

Boca cala Engenhão e segue na Libertadores

Ivo Alves é o nome do profeta. O pai de Carleto. O pai que sonhou que o filho faria um gol no Boca Juniors. De falta. Carleto fez! Aos 17 minutos de jogo no Engenhão tricolor (31 mil pagantes e 36mil presentes), o filho do seu Ivo bateu falta da intermediária, a bola resvalou nas costas de um xeneize e estava aberto o marcador. O Flu jogava melhor, não deixava o Boca Juniors jogar e Diego Cavalieri assistia ao jogo de dentro do campo. Mas os brasileiros não fizeram o segundo gol e veio o segundo tempo.

Com o Boca em ação.

O Flu todo jogava bem, com exceção de Thiago Neves e de Rafael Sóbis, que desperdiçara uma chance logo no começo do jogo e outra, aos 15 do segundo tempo, simplesmente imperdível, na pequena área. O  Flu não se contentava com o placar que levaria à marca da cal, no que estava certo, mas começava a se afobar quando o segundo tempo chegava ao meio.

O Boca, imobilizado, catimbava ao ritmo de um impotente Riquelme. Aos 30, Abel Braga ousou e pôs Wellington Nem no lugar de  Wágner, quando a troca aparentemente mais acertada seria a saída de Thiago Neves. Aos 35,  titubeante, Rafael Moura não fez o gol das semifinais. Ah, se fosse o Fred… Estranhamente, aos 44, Abelão tirou o experiente Sóbis e pôs o menino Marcos Júnior para bater pênalti.

E, aos 45, o Boca empatou com Santiago Silva. Parecia mentira. Na única chance… Futebol.

Por una cabeza… O Flu segue em busca de sua primeira Libertadores. E o Boca do hepta… (Do blog de Juca Kfouri)

Pela fórmula mais enxuta

Por Gerson Nogueira

Fórmulas para disputa do campeonato estadual serão postas na mesa, hoje, no Conselho Técnico da FPF. Será uma chance de ouro para que os clubes evitem a avacalhação completa da competição, que a cada ano se consolida como tecnicamente ruim e deficitária sob todos os pontos de vista. Caso os principais clubes estejam de fato interessados em organizar o Parazão, a proposta atual (com oito clubes) será novamente consagrada.
Pode ser aperfeiçoada com a redução do número de jogos nas semifinais e finais de turnos. Para que fazer duas partidas se a decisão em 90 minutos é bem mais emocionante? Além disso, a partida única representa economia num torneio marcado por prejuízos. Somente na decisão final é que seriam disputados dois jogos, com vantagem para o time com a maior pontuação.
Remo e Paissandu, as duas locomotivas do nosso futebol, têm a obrigação moral de tornar o campeonato mais qualificado e rentável. Ambos têm liderança e votos para garantir a melhor fórmula, desde que consigam cooptar outros clubes igualmente organizados, como Águia e São Francisco.
No outro extremo, surge uma mobilização para inchar a competição com 14 clubes. A proposta foi engendrada pelo Independente, campeão de 2011 rebaixado nesta temporada. A idéia é fazer com que, além dos oito atuais integrantes, o campeonato abrigue times que disputariam o acesso.
Além de francamente casuística, por contemplar os interesses diretos do próprio Independente, o formato devolve o Parazão a outros tempos, quando o nível técnico das equipes era a última das preocupações.
Caso se deixe enredar por essa infeliz idéia, a dupla Re-Pa estará assinando atestado de omissão, irresponsabilidade e burrice. Responsáveis pelas poucas arrecadações lucrativas, os dois grandes devem ter noção do papel que representam e do poder de fazer com que o Parazão seja uma competição enxuta e atraente do ponto de vista técnico. Se aceitarem a fórmula do prejuízo não terão mais direito de reclamar da sorte.   
 
 
Tudo começou pelas mãos de Ricardo Teixeira, que avalizou acordo para que o Rio Branco retirasse ação da Justiça Comum na Série C do ano passado – embora, na origem, o clube acreano estivesse prenhe de razão. Essa armação gera neste momento uma balbúrdia poucas vezes vista no país pentacampeão. O adiamento dos campeonatos das séries C e D coroa, com algum atraso, a gestão de Teixeira, senhor dos esquemas e conchavos. Que ninguém culpe Treze e Brasil de Pelotas. A lambança tem a assinatura inconfundível do ex-chefão da CBF. A César o que é de César.
 
 
Sumiço de Magnum do Baenão tem ressuscitado aquelas velhas histórias de travessia da Almirante Barroso, tão em voga nos anos 60 e 70. Há quem garanta que o jogador, oficialmente viajando a São Paulo, já estaria apalavrado com o Paissandu. A alimentar essas especulações o fato de Magnum ter despontado na Curuzu. Mistério só será desvendado na sexta-feira, prazo final para a reapresentação do jogador.
 
 
O gol perdido por Diego Souza aos 18 minutos, sozinho, diante do goleiro, é daqueles lances que o torcedor vai guardar para sempre na memória. Para completar, logo no lance seguinte Nilton cabeceou no travessão corintiano. Por ironia, também num cabeceio, a vitória do Corinthians se desenhou nos instantes finais. 
O Corinthians passou às semifinais da Libertadores, com a economia habitual de categoria. Pouco importa se o futebol é tosco, se o time joga como britadeira. Os programas esportivos da TV irão passar a quinta-feira endeusando a façanha alvinegra, com imagens do técnico Tite no meio da galera. A consagração do marketing de alambrado.
No outro confronto, o Fluminense também morreu no derradeiro instante. Um gol surpreendente de Santiago Silva, o tanque do Boca, calou a torcida tricolor no Engenhão. Castigo cruel que não se deve desar ao pior inimigo.  
 
“Meu filho, o couro vem da vaca. O que é que a vaca come? Grama. Então, segue a ordem natural das coisas: passa a bola, rasteirinho”. Ensinamento lapidar do mestre Gentil Cardoso, que devia ser exibido no placar eletrônico dos jogos no Brasil. Talvez assim os boleiros aprendessem esse mandamento básico do futebol.

(Coluna publicada na edição do Bola/DIÁRIO desta quinta-feira, 24)