Tacacá do Renato – foto da chef Roberta Sudbrack, via site Belém do Pará.
Dia: 21 de maio de 2012
El dia em que Herrera silenciou a Rede Globo
Por Xico Sá
A semana já começa com um #mito nacional definido. E herói bom é herói argentino. El dia em que Herrera compôs um tango desobediente com Amy Winehouse, acompanhe o meu raciocínio em preto & branco para uma segunda de ressaca. Herrera aqui não é celebrado por ter feito três gols no tricolor paulista. Longe disso, embora meu corvo secador, botafoguense doente, tenha crocitado no seu luxuoso poleiro.
Não por isso, agourento Edgar, minha estimada ave, me dê outros motivos. Por uma outra razão mais edificante, e pedagógica, já abrimos a segunda-sem-lei com a escolha de Herrera, boleiro do time da Estrela Solitária, como o mito da semana. Acho sensacional essa ideia do mito de 15 minutos. Obra do artista norte-americano Andy Wahrol que encontrou nas redes sociais a plantação perfeita. O maná virtual que adubando tudo dá.
Convidado por um repórter da “Tv Globo”, no dever do seu nobre ofício, a escolher uma música no programa “Fantástico”, o argentino se recusou a indicar a “canción”, ao contrário de todos os colegas de profissão, que babam para pedir um pagode mela-cueca ou um gospel nesse momento de glória. Quem marca três gols tem o “privilégio”.
Bem que Herrera poderia pedir um tango de Gardel –La noche que mi quieras-, uma milonga dos tempos do Rosário Central, um rock argentino do Attaque 77 etc etc. Herrera bancou a Amy, que era botafoguense sem saber-se alvinegra, e disse simplesmente: “I no, no, no”. Rehab Futebol e Regatas. Herrera pediu silêncio à Rede Globo, como uma espécie de Leonel Brizola ludopédico.
Bacana que no país da manada obediente, principalmente no futiba, um boleiro não caia na graça dos Joões Sorrisões. Herreza fez a Amy. Foi o bastante para que a conspiração do boteco fervesse: o atacante alvinegro vai pagar caro por isso. Como se o Botafogo precisasse de castigo da Globo, dona das transmissões do futebol no Brasil, ou de qualquer outra entidade mitológica.
Botafogo é o que nem Dostoievsky imaginaria no seu “Crime e Castigo”. Ora, ora, o time da Estrela Solitária é castigado com ou sem desobediência, desde nascença. É sina. Mas largou com cara de campeão deste ano. Senti firmeza. Mesmo que não jogue bola daqui até dezembro, tem dois grandes méritos: Herrera e o uruguaio Loco Abreu, os mais esclarecidos boleiros em atividades no país.
P.S. Falar no assunto desobediência, vos comunico: o prezado amigo Afonsinho, por coincidência craque também do Botafogo, escreve agora na “Carta Capital”, em diálogo permanente com Sócrates, seu colega de Medicina e de consciência, ex-articulista da mesma publicação.
Boa semana a todos e que a ressaca da segundona, moral ou física, nos seja leve.
Fibra, dignidade, coragem. Botafoguenses são assim, desde sempre. Herrera honrou a camisa.
A frase do dia
“É duro perder quando seu time é superior. O Botafogo achou três pontos e nós oferecemos. No dia em que homenageavam o Nilton Santos, nós homenageamos o Botafogo. Quando você põe dois jogadores para colocar fogo no jogo, e acontece minutos depois algo disso, ao invés de você ter o incentivo você tem um momento desagradável. O excesso de zelo está custando muito caro. O grande artista nem assinava seus quadros, às vezes. Não precisa disso e o beque chega. Por isso que estou dizendo que nós puxamos a derrota e ela veio”.
De Emerson Leão, técnico do S. Paulo, com a pesporrência habitual, incapaz de reconhecer uma derrota justa.
Xuxa transforma telespectador em psicólogo
Por Maurício Stycer
Lembrando que o “Jornal Nacional” dedicou dez minutos para falar do parto de Sasha, chega a ser curto o tempo (25 minutos) oferecido a Xuxa no “Fantástico” para fazer revelações surpreendentes sobre a sua vida, entre as quais a oferta que recebeu para se casar com Michael Jackson e a confissão de que sofreu seguidos abusos sexuais na infância. O relato sobre a proposta que teria recebido do empresário de Jackson é especialmente curioso. Xuxa foi muitas vezes comparada ao cantor americano por conta da estanha imagem que construiu, de uma vida sem amigos nem amores, protegida em uma “bolha”, isolada do mundo real.
A entrevista ao “Fantástico”, como tantas situações protagonizadas por Xuxa, foi um evento “controlado”, ao longo do qual ela foi senhora da situação. Disse apenas o que quis, da forma que achou melhor. Isso incluiu, por exemplo, o fato de falar de Adriane Galisteu sem que o nome ou a imagem da “rival” aparecesse na edição ou, ainda, o fato de não mencionar o pai de sua filha.
Ao conhecer Senna e se encantar pelo piloto, Xuxa revelou ter pensado: “Um cara com grana que não vai querer a minha”. Este mesmo pragmatismo aparece ao longo de quase todo o depoimento dado a Claudio Manoel. Séria, sem emoção maior, com o texto na ponta da língua, falou da infância em Bento Ribeiro, do começo na Bloch, do seu namoro de seis anos com Pelé e da descoberta de que Senna era sua “alma gêmea”. Já ao descrever a sua atual carência afetiva e sexual, riu como se fosse uma criança. “Os hormônios”, exclamou, sem saber se reclamava ou festejava do fato de sentir desejo.
Por fim, veio a parte barra pesada do depoimento. “Eu fui abusada”, ela disse, com todas as letras. “Não foi uma pessoa, foram algumas pessoas que fizeram isso”, continuou, antes de citar “o melhor amigo” do pai, “o cara que ia casar com a minha avó” e um professor da escola como autores de abusos que sofreu. Para além das inquietações de caráter psicológico que este depoimento suscita, não é possível ver a participação de Xuxa no “Fantástico” sem deixar de pensar na guerra da audiência em que o dominical da Globo está envolvido e na pouca empolgação que o programa da própria apresentadora suscita nos dias de hoje.
Por que revelar em rede nacional um trauma desta gravidade? Xuxa está engajada numa campanha contra o abuso de crianças e pode ter pensado que o seu depoimento ajudaria a tornar o tema menos tabu. É provável que isso até ocorra, mas acho que há formas e formas de fazer campanhas educativas. O depoimento de Xuxa, creio, faz pensar basicamente sobre Xuxa. Transforma todos os espectadores em psicólogos de botequim. Somos obrigados, de uma hora para outra, a voltar a especular sobre a vida e a carreira da “rainha dos baixinhos” e sobre o seu comportamento em diferentes situações. O que é muito triste, enfim.
Capa do DIÁRIO, edição de segunda-feira, 21
Futebol bronco e campeão
Por Gerson Nogueira
Dos grandes times europeus, o Chelsea é dono do futebol mais tosco – se é que aquilo que jogam na Inglaterra é mesmo futebol. Pois o time do bilionário russo Abramovich agora é campeão europeu. E aí, como ficam os detratores do azulino de Londres? Bem, lamento pela Europa, mas o Chelsea é tudo isso que falam dele. Joga (muito) feio, dando chutão o tempo todo, parando jogadas com falta e correndo dos dribles como o diabo corre da cruz.
Não é por ser um brazuca, ou talvez por isso mesmo, mas quando Ramires está em campo a bola fica um pouquinho mais redonda. Sabe passar, domina a pelota com intimidade e até arrisca uns dribles – imagino que lá nos vestiários de Stamford Bridge, exista uma placa em letras vermelhas ameaçando de açoite qualquer engraçadinho que se meta a driblar.
Sempre que vejo equipes inglesas jogando faço uma viagem mental ao passado, quando Garrincha apelidava seus marcadores de “joões”. Tinha a cintura dura, dizia-se. Os vídeos da época confirmam: os europeus eram incapazes de uma ginga ou um passe de trivela. Quando perceberam essa impossibilidade física, passaram a importar os especialistas.
Como Ramires estava suspenso, o Chelsea foi apenas o Chelsea e disputou uma partida absolutamente heróica para os seus padrões dentro dos domínios do Bayern, outro colosso europeu, que também é chegado a maltratar a bola com ritos sádicos.
Ocorre que, em comparação com os ingleses, o estilo do Bayern é até elegante. Afinal, existem alguns craques vestindo a camisa vermelha. Robben, Lahm, Müller, Ribery. São figuras que amenizam o jeito bate-estaca tão ao gosto dos germânicos.
Engraçado é que quando o futebol é rudimentar a gente se distrai e passa a prestar atenção em outras coisas. Ao invés de ficar atento ao andamento da peleja, comecei a admirar o espetáculo das torcidas e a maravilha arquitetônica que é o estádio Allianz Arena, uma fabulosa construção que encanta qualquer visitante.
Tive o privilégio de conhecer o estádio, ao lado da equipe da Rádio Clube/DIÁRIO em 2006, por ocasião da Copa do Mundo. Posso dizer que as imagens, se servem para matar a saudade, nem de longe mostram o que é de fato aquela arena.
Em meio às reminiscências, pude escapar um pouco da sessão de tortura a que a bola era submetida na final da Liga dos Campeões. No tempo normal, foram quase 90 minutos de trombadas, choques e chutes a esmo.
Não anotei uma finta sequer. Nem Robben, o arisco ponteiro holandês, teve a pachorra de fazer uma firula. Era pegar a bola e tocar para o lado. Do lado inglês, Lampard, o mais lúcido, jogava de volante à moda antiga, espanando todas na meia-cancha.
O gol de Müller surgiu em jogada aérea, assim como o empate, cinco minutos depois, de Drogba. Iguais em tudo, os dois caríssimos esquadrões começaram a prorrogação e, logo de cara, veio o penal favorável ao Bayern. Robben bateu mal e o gigante Cech pegou. Bem, pior para o jogo, pois a partir daí o holandês nem tocou mais na bola. Traumatizado, fugiu até das cobranças de penalidade.
Merecida festa inglesa na final mais européia dos últimos anos. Nunca o Velho Continente foi tão bem representado numa decisão. Foi uma espécie de tributo a essa Europa dos primórdios (pré-Barcelona), que praticava futebol como rúgbi.
O técnico Flávio Lopes deve reiniciar hoje os treinamentos do Remo para a Série D. Não terá mais um atacante que substitua Fábio Oliveira ou que possa se revezar com Reis na ligação com o ataque. Marciano, que fazia esses papéis, foi descartado. Não chega a espantar a dispensa, pois o atacante teve pouquíssima participação no Parazão, derrubado por uma contusão.
O que chamou atenção de todos foi a opção do técnico por Cassiano depois da contratação de Marcelo Maciel, que tem estilo semelhante e certamente será o titular do ataque ao lado de Oliveira. Técnicos costumam ter uma visão bem particular das coisas, às vezes desafiando a realidade, mas a preferência por um jogador menos talhado para as funções de área não combina com a situação atual do elenco remista.
(Coluna publicada na edição do Bola/DIÁRIO desta segunda-feira, 21)