Quando surge a pergunta sobre o maior rival de Ayrton Senna na Fórmula 1, a resposta imediata é Alain Prost, francês com quem o brasileiro dividiu os boxes da McLaren em 1988 e 1989. No documentário ‘Senna’, com estreia prevista para o dia 12 deste mês, Prost é o principal coadjuvante. Mas tem sua imagem de vilão parcialmente desconstruída. O francês é mostrado de forma diferente daquele em que figurou na mídia brasileira antes, durante e depois de sua rivalidade com Ayrton. O documentário mostra um Prost bem-humorado, galanteador e muito mais humano do que a imagem do piloto pragmático que raramente se envolvia em acidentes e colecionava grandes resultados.
‘Senna’ mostra que o grande adversário de Ayrton Senna nas pistas não usava capacete, nem dividia curvas com o brasileiro em alta velocidade. O vilão verdadeiro do filme é abstrato. Há quem chame de “sistema”, de “política”, de “mundo da Fórmula 1”. Nos tempos se Senna, chamava-se Jean-Marie Balestre, presidente da FIA.
Em uma das cenas raras do filme, Senna e Balestre batem boca em uma reunião de pilotos antes da corrida. O dirigente, com seu discurso napoleônico, personifica tudo que o brasileiro mais detestava na categoria. “O maior adversário do Ayrton não foi o Prost. O adversário dele foi o sistema. Era muita política, e ele só queria correr. Ele pagou muito caro por isso”, disse Viviane Senna, irmã do tricampeão e que atualmente comanda o Instituto Ayrton Senna.
O documentário aprofunda-se na relação do brasileiro com Alain Prost, em suas mágoas com a politicagem na Fórmula 1 e em aspectos pouco divulgados de sua vida pessoal. Mas o filme também deixa em um plano muito distante personagens fundamentais na vida do tricampeão durante sua passagem pela Fórmula 1. Três deles – Nelson Piquet, Gerhard Berger e Michael Schumacher – são as ausências mais sentidas entre os pilotos. Piquet foi, antes da rivalidade com Prost, um duro rival para Senna na Fórmula 1. Se os dois não chegaram a trocar farpas pelo que acontecia dentro das pistas, quando tiravam o capacete eles nunca se deram bem. O auge da rivalidade aconteceu no início de 1988, quando Piquet disse em entrevista ao Jornal do Brasil que Senna “não gostava de mulher”. O caso acabou na Justiça, e um protocolar pedido de desculpas evitou que Piquet fosse punido.
Em ‘Senna’, Piquet aparece apenas duas vezes, ambas nos briefings, as reuniões dos pilotos antes das corridas. Na primeira, em 1990, no Japão, ele sugere que os pilotos possam cortar a chicane Casio, no caso de acidentes. Todos concordam e Senna se revolta – no ano anterior, ele perdera a chance de brigar pelo título pelo mesmo motivo. Consternado com o que acreditava ter sido uma manobra irônica de Piquet, Senna deixa a reunião.Horas depois, ele bateria em Prost para ser bicampeão mundial.
Na segunda aparição, Piquet aparece sem tanto protagonismo, em outra reunião dos pilotos. Diante de um impasse sobre a utilização de uma proteção de pneus, o então presidente da FIA, Jean-Marie Balestre, sugere uma votação entre os pilotos. Imediatamente, Piquet levanta a mão, como se já estivesse votando. Depois, jocosamente, ele levanta a mão para votar a favor e contra a medida. Por fim, levanta as duas mãos, arrancando risos de todos na sala.
Amigo esquecido – Gerhard Berger, considerado por Senna seu melhor amigo na Fórmula 1, também pouco aparece. O austríaco não tem seu depoimento no documentário e não é citado, nem mesmo marginalmente, no GP do Japão de 1991. Naquela prova, Berger ajudou Senna e ganhou de presente a vitória, na última curva da última volta. Curiosamente, ao falar daquela temporada, o filme cita que Prost está na Ferrari, mas em nenhum momento lembra o espectador de que Senna tinha um novo companheiro de equipe. (Da ESPN)