Dia: 7 de outubro de 2010
Estadão demite autora de artigo pró-Lula
Por Bob Fernandes (do Terra Magazine)
A psicanalista Maria Rita Kehl foi demitida pelo Jornal O Estado de S. Paulo depois de ter escrito, no último sábado (2), artigo sobre a “desqualificação” dos votos dos pobres. O texto, intitulado “Dois pesos…”, gerou grande repercussão na internet e mídias sociais nos últimos dias. Nesta quinta-feira (7), ela falou sobre as consequências do seu artigo:
– Fui demitida pelo jornal o Estado de S. Paulo pelo que consideraram um “delito” de opinião (…) Como é que um jornal que anuncia estar sob censura, pode demitir alguém só porque a opinião da pessoa é diferente da sua?
Veja trechos do artigo “Dois pesos” (publicado aqui no blog).
Leia abaixo a entrevista.
Maria Rita, você escreveu um artigo no jornal O Estado de S.Paulo que levou a uma grande polêmica, em especial na internet, nas mídias sociais nos últimos dias. Em resumo, sobre a desqualificação dos votos dos pobres. Ao que se diz, o artigo teria provocado conseqüências para você…
Maria Rita Kehl – E provocou, sim…
– Quais?
– Fui demitida pelo jornal O Estado de S.Paulo pelo que consideraram um “delito” de opinião.
– Quando?
– Fui comunicada ontem (quarta-feira, 6).
– E por qual motivo?
– O argumento é que eles estavam examinando o comportamento, as reações ao que escrevi e escrevia, e que, por causa da repercussão (na internet), a situação se tornou intolerável, insustentável, não me lembro bem que expressão usaram.
– Você chegou a argumentar algo?
– Eu disse que a repercussão mostrava, revelava que, se tinha quem não gostasse do que escrevo, tinha também quem goste. Se tem leitores que são desfavoráveis, tem leitores que são a favor, o que é bom, saudável…
– Que sentimento fica para você?
– É tudo tão absurdo… A imprensa que reclama, que alega ter o governo intenções de censura, de autoritarismo…
– Você concorda com essa tese?
– Não, acho que o presidente Lula e seus ministros cometem um erro estratégico quando criticam, quando se queixam da imprensa, da mídia, um erro porque isso, nesse ambiente eleitoral pode soar autoritário, mas eu não conheço nenhuma medida, nenhuma ação concreta, nunca ouvi falar de nenhuma ação concreta para cercear a imprensa. Não me refiro a debates, frases soltas, falo em ação concreta, concretizada. Não conheço nenhuma, e, por outro lado…
– …Por outro lado…?
– Por outro lado a imprensa que tem seus interesses econômicos, partidários, demite alguém, demite a mim, pelo que considera um “delito” de opinião. Acho absurdo, não concordo, que o dono do Maranhão (senador José Sarney) consiga impor a medida que impôs ao jornal O Estado de S.Paulo, mas como pode esse mesmo jornal demitir alguém apenas porque expôs uma opinião? Como é que um jornal que está, que anuncia estar sob censura, pode demitir alguém só porque a opinião da pessoa é diferente da sua?
– Você imagina que isso tenha algo a ver com as eleições?
– Acho que sim. Isso se agravou com a eleição, pois, pelo que eles me alegaram agora, já havia descontentamento com minhas análises, minhas opiniões políticas.
Os mistérios da Arena do Aurá
Da coluna de Guilherme Augusto, no DIÁRIO de hoje
Tempo quente
Foi preciso a intervenção da juíza Ida Selene, do Tribunal Regional do Trabalho, para que não acontecesse o pior na última reunião realizada no TRT, entre a comissão que investiga a tumultuada venda do Baenão e membros da diretoria do Remo.
À certa altura do encontro, o ex-presidente do Remo, Manoel Ribeiro, perguntou ao atual vice-presidente da agremiação, Orlando Frade, qual o motivo de sua obsessão pelo terreno do Aurá para ser o lugar da construção da futura Arena do Leão.
Corretor, eu?
Frade, que é tido como o corretor do negócio, entendeu a provocação. Reagiu, pedindo explicações num tom não compatível com um tribunal.
Aí, felizmente, entrou em cena a magistrada, advertindo a dupla que se não se comportassem ela seria obrigada a chamar a segurança da corte do Trabalho. A reunião, enfim, pode prosseguir.
Ditadura azulina
Por sinal, haverá reunião do Condel do Remo hoje à noite, com uma novidade determinada pelo presidente do clube, Amaro Klautau: na pauta do encontro não consta o item “o que ocorrer”.
– Como assim? É a primeira vez que vejo isso na vida. Até em reunião do Congresso Eucarístico esse item deve constar – ensina o benemérito (seria grande?) do clube, Ronaldo Passarinho.
Peixe de Zé Love põe Flu de Muricy na roda
Loco Abreu salva o Bota em Campinas
Marina, você se pintou?!
Por Maurício Abdalla (*)
Marina, morena Marina, você se pintou, diz a canção de Caymmi. Mas é provável, Marina, que pintaram você. Era a candidata ideal: mulher, militante, ecológica e socialmente comprometida com o grito da Terra e o grito dos pobres, como diz Leonardo. Dizem que escolheu o partido errado. Pode ser. Mas, por outro lado, o que é certo neste confuso tempo de partidos gelatinosos, de alianças surreais e de pragmatismo hiperbólico? Quem pode atirar a primeira pedra no que diz respeito a escolhas partidárias?
Mas ainda assim, Marina, sua candidatura estava fadada a não decolar. Não pela causa que defende, não pela grandeza de sua figura. Mas pelo fato de que as verdadeiras causas que afetam a população do Brasil não interessam aos financiadores de campanha, às elites e aos seus meios de comunicação. A batalha não era para ser sua. Era de Dilma contra Serra. Do governo Lula contra o governo do PSDB/DEM. Assim decidiram as famiglias que controlam a informação no país. E elas não só decidiram quem iria duelar, mas também quiseram definir o vencedor. O Estadão dixit: Serra deve ser eleito.
Mas a estratégia de reconduzir ao poder a velha aliança PSDB/DEM estava fazendo água. O povo insistia em confirmar não a sua preferência por Dilma, mas seu apreço pelo Lula. O que, é claro, se revertia em intenção de voto em sua candidata. Mas os filhos das trevas são mais espertos do que os filhos da luz. Sacaram da manga um ás escondido. Usar a Marina como trampolim para levar o tucano para o segundo turno e ganhar tempo para a guerra suja. Marina, você, cujo coração é vermelho e verde, foi pintada de azul.
Azul tucano. Deram-lhe o espaço que sua causa nunca teve, que sua luta junto aos seringueiros e contra as elites rurais jamais alcançaria nos grandes meios de comunicação. A Globo nunca esteve ao seu lado. A Veja, a FSP, o Estadão jamais se preocuparam com a ecologia profunda. Eles sempre foram, e ainda são, seus e nossos inimigos viscerais. Mas a estratégia deu certo. Serra foi para o segundo turno, e a mídia não cansa de propagar a vitória da Marina. Não aceite esse presente de grego. Hão de descartá-la assim que você falar qual é exatamente a sua luta e contra quem ela se dirige.
Marina, você faça tudo, mas faça o favor: não deixe que a pintem de azul tucano. Sua história não permite isso. E não deixe que seus eleitores se iludam acreditando que você está mais perto de Serra do que de Dilma. Que não pensem que sua luta pode torná-la neutra ou que pensem que para você tanto faz. Que os percalços e dificuldades que você teve no Governo Lula não a façam esquecer os 8 anos de FHC e os 500 anos de domínio absoluto da Casagrande no país cuja maioria vive na senzala. Não deixe que pintem esse rosto que o povo gosta, que gosta e é só dele.
Dilma, admitamos, não é a candidata de nossos sonhos. Mas Serra o é de nossos mais terríveis pesadelos. Ajude-nos a enfrentá-lo. Você não precisa dos paparicos da elite brasileira e de seus meios de comunicação. Marina, você já é bonita com o que Deus lhe deu.
(*) Professor de filosofia da UFES, autor de “Iara e a Arca da Filosofia” (Mercuryo Jovem), dentre outros.
Para reflexão
Capa do DIÁRIO, edição de quinta-feira, 7
Coluna: A responsabilidade final
O Conselho Deliberativo do Remo reúne, hoje, para tratar do processo de venda do estádio Evandro Almeida. Nada de bombástico deve sair do relatório da comissão criada (com atraso) para acompanhar o negócio. Os conselheiros designados para a tarefa pouco, quase nada, podem fazer, visto que a transação parece definitivamente firmada, apesar de não haver ainda nenhum documento oficial assinado.
A comissão só fez acompanhar os últimos lances da nebulosa transação que vai inserir o Remo num patamar inédito entre os clubes brasileiros centenários e donos de grande torcida: será o primeiro a, por iniciativa própria, dilapidar seu patrimônio com o alegado objetivo de sanear as finanças. Se a comissão está de mãos e pés atados, o Condel ainda pode fazer algo para corrigir sua vergonhosa omissão nessa triste novela.
Há dois anos, desde que o atual presidente assumiu, o único projeto executado e seguido à risca no clube foi o da venda do estádio. Enquanto isso, o time envolveu-se em duas campanhas estaduais inglórias. Depois de um ano apeado de campeonatos nacionais, classificou-se às duras penas para a Série D em 2010, de onde acabou eliminado por um time semi-amador de Estado sem tradição futebolística.
Em meio à barafunda instaurada no clube, dominado por um presidente que se dedica obcecadamente à função de corretor imobiliário e representante da única firma interessada na compra, chega a ser espantoso que não apareça um conselheiro capaz de liderar uma reação à insanidade do tal projeto de “permuta” do Baenão por uma arena da qual só se conhece a maquete.
Integrantes da comissão descobriram, abismados, que os passos de AK foram cuidadosamente calculados ao longo de cada etapa da operação de desmanche do patrimônio azulino. Sempre na surdina, o presidente pôs em marcha o plano de venda, cuidando inicialmente de desonrar os compromissos junto à Justiça do Trabalho ao mesmo tempo em que demolia a imagem institucional do clube, dando publicidade a dívidas cujos valores hoje não se confirmam. Incluiu na conta até débitos já quitados pelo Remo, como o acordo com o jogador Vélber.
O ato de destruir a picaretadas o símbolo do clube no pórtico do Baenão, aparentemente insano, foi apenas um truque para cercar de garantias a venda do estádio e anular um eventual pedido de tombamento. Tanto empenho em se desfazer do principal patrimônio do clube, localizado na área mais valorizada do centro de Belém, obviamente não tem como razão maior a situação do clube. Pelo contrário. Aparenta, sob todos os pontos de vista, a satisfação de um projeto pessoal e isso fica ainda mais claro quando se sabe que, ao cabo de três meses, terminará o mandato da atual diretoria.
Diante disso, é estranho que o Condel aceite passivamente a situação de descalabro e não tome a iniciativa de apelar à Justiça por um novo prazo, até a posse da futura diretoria – e a tempo de achar alternativa para evitar a perda do imóvel ou vendê-lo por um preço decente. Ainda há tempo.
(Coluna publicada na edição do Bola/DIÁRIO desta quinta-feira, 7)