À espera de um sopro renovador
O presidente da CBF, sem se desculpar pelas escolhas obtusas que fez, avisou ontem que o futuro técnico da Seleção Brasileira não será um nome “surpreendente”. Será, portanto, uma cobra criada, com bagagem suficiente para assumir o desafio de responder pelo escrete num momento de grande desgaste e frustração do torcedor. Ricardo Teixeira sabe que a preparação do Brasil deve começar de imediato, com foco na formação de um novo time. Novo, diga-se, de verdade. Com jogadores jovens, que sejam capazes de ir até a Copa do Mundo de 2014.
O desafio é reformular a Seleção justamente para o Mundial promovido no Brasil. Quem assumir deve estar conscinete de que será uma missão à altura dos trabalhos de Hércules. O nível de pressão a que o treinador será submetido vai fazer parecer um inocente piquenique a cobrança exercida sobre Dunga na Copa 2010. Todos os olhos estarão postos no time, com baixíssimo (ou nenhum) nível de tolerância ao fracasso. Depois do desastre de 1950, o torcedor não aceitará uma campanha pálida como a das últimas duas Copas.
Para a execução desse projeto de alto risco, nem se cogita a nomeação de um treinador inexperiente, como ocorreu com Dunga para o Mundial da
África do Sul. O novo comandante precisa ter respaldo popular, currículo profissional impecável e firme disposição para empreender a inadiável renovação do atual grupo de jogadores. Da equipe eliminada pela Holanda na última sexta-feira, pouquíssimos serão aproveitados e conseguirão sobreviver em alta até 2014. Creio que somente Júlio César, Kaká, Robinho e Maicon talvez suportem os ventos da mudança, embora seja provável que o técnico prefira trabalhar com outros nomes.
Além da pressão pela formação de um time jovem e vencedor, combinação nem sempre possível, haverá o clamor pelo resgate do estilo genuinamente brasileiro, que privilegia a técnica e habilidade. O fantasma das últimas Copas, com seleções limitadas e pouco preocupadas em atacar, que não conseguiram superar a barreira das quartas de final, estará mais presente do que nunca. O excesso de cuidados com a marcação, próprio do chamado futebol pragmático, não rendeu os resultados apregoados. A eficiência, tão ao gosto de Parreira e Dunga, não teve qualquer utilidade no enfrentamento com times ligeiramente superiores – França, há quatro anos, e Holanda, aqui na África.
O técnico ungido pela CBF, que deverá assumir já em agosto, enfrentará um problema extra: não terá condições de preparar a Seleção adequadamente, pois o país-sede da Copa não disputa as eliminatórias. Como se sabe, amistosos nem sempre permitem avaliar o verdadeiro estágio de um time. Será necessário elaborar uma agenda séria (e seletiva) de compromissos internacionais para testar os novos jogadores. O lado positivo é que o Brasil, como berço de craques, terá a chance privilegiada de debruçar suas vistas sobre um elenco de grandes e futurosos atletas. Paulo Henrique Ganso, Neymar, Pato, Lucas, Hernanes, Felipe Alvim e tantos outros que ainda irão aparecer.
No futebol, como na vida, há males que sempre vêm para o bem. À espera da definição do novo campeão do mundo, fico a imaginar o que seria do
futebol brasileiro se a tática conservadora que a Seleção mostrou em gramados sul-africano fosse recompensada com o título. Num torneio marcado pelo nivelamento e parcas manifestações de talento, essa possibilidade nem seria tão absurda. O problema é que talvez nunca mais, pelo menos para a minha geração, se conseguisse escapar dessa maldição.
Felipão, o nome mais forte
Cerca de oito nomes já foram especulados para assumir o lugar de Dunga na Seleção. Vanderlei Luxemburgo, Abel, Muricy Ramalho, Mano Menzes,
Ricardo Gomes e até Parreira entrou na roda. No entanto, pela maneira silenciosa com que Luís Felipe Scolari tem se comportado, arrisco dizer que ele será o novo treinador. Tem todos os predicados exigidos para a função, embora mantenha aquela mania de adorar volantes que é própria da escola gaúcha. Apesar disso, carrega o mérito de ter levado o Brasil ao pentacampeonato e é um nome sem rejeições junto à massa. Depois da experiência com o Capitão do Mato, duvido que a CBF se disponha a correr novos riscos.
Ninguém deve subestimar a fibra uruguaia
Uruguai e Holanda decidem hoje, na Cidade do Cabo, uma das vagas à finalíssima da Copa do Mundo da África do Sul. Em termos estritamente técnicos, os holandeses são superiores e merecem o favoritismo que lhes é atribuído. Fazem campanha impecável (cinco vitórias em cinco jogos) e têm alguns jogadores de qualidade acima da média. Sneijder, Robben e Van Persie são muito bons, embora nem sempre estejam inspirados. No primeiro tempo do jogo contra o Brasil, estiveram sumidos. Na etapa final, cresceram junto com o time, a partir de um gol acidental. O Uruguai tem apenas Forlan como trunfo ofensivo, já que o ágil Suárez cumpre suspensão, depois da expulsão pelo pênalti (heróico) cometido para salvar a Celeste diante de Gana. Apesar desse flagrante desnível, creio em jogo duríssimo, que vai contrapor a técnica holandesa à raça uruguaia. Não descarto a possibilidade de um
resultado surpreendente.
(Coluna publicada no caderno Bola/DIÁRIO, edição desta terça-feira, 6)