Coluna: Sobre pais e filhos

Só um detalhe ainda faz com que a imprensa e o mundo esportivo de todo o Brasil reconheçam a grandeza do Pará no futebol: a febre de bola que campeia por aqui. Não é pouca coisa. Para nós, aliás, é tudo. Representa a última gota de orgulho que ainda podemos brandir, principalmente depois que Belém perdeu a disputa para sediar jogos da Copa de 2014.
Você há de perguntar por que me refiro a esse patrimônio natural do futebol paraense em pleno dia dedicado aos pais. É simples: dos pais é que nascem as paixões e as escolhas dos filhos. No futebol, embora não haja estudo científico que embase a minha tese, creio que em 99% dos casos os descendentes assumem as mesmas bandeiras de seus velhos.
Pertenço a este mínimo percentual das ovelhas desgarradas, que se insurgiram contra a orientação paterna. Meu pai José, vascaíno de quatro costados, não me transferiu a sua afeição pelo clube da Colina. Não teve culpa. Naquele período, entre 1966 e 1968, de beatlemania e tropicália, a fase não era das mais risonhas lá por S. Januário.
Ao contrário, o Botafogo respirava as glórias recentes de Mané Garrincha, Didi, Amarildo, Paulo Valentim, Nilton Santos, Quarentinha e Zagallo. As revistas que chegavam até Baião relatavam, com fartura de detalhes, as conquistas e mágicas daquele timaço.
Lembro de ficar ao lado de meu pai, debruçado na ampla janela de casa, ouvido ligado na domingueira da PRC-5 a retransmitir grandes embates nacionais, em cadeia com a Nacional e a Globo do Rio.
Ali, entre uma ou outra frase de efeito de Waldir Amaral (“indivíduo competente… 10 é a camisa dele…”), ouvia seus comentários e dicas sobre o futebol romântico que aqueles tempos ainda permitiam.
Quando o Botafogo construiu outro super time, apelidado mui justamente de Selefogo, já veio me encontrar cooptado pela magia da Estrela Solitária. Tempos de Gerson, Jair, Paulo César, Rogério, Roberto Miranda, Leônidas.
Meu pai bem que tentou, à sua maneira, com humor e informação, mostrar que o Vasco era o Vasco, mas, àquela altura, eu já era Botafogo. Até a medula. Era o time da moda, não havia como escapar ao fato. E, com a compreensão generosa que todo pai tem, ele aquiesceu que eu fosse ser botafoguense na vida. 
   
 
Tive mais sorte com os meus. Pedro e João são botafoguenses, cantam o hino, vestem a camisa. Acompanham os jogos, xingam árbitros, sofrem e vibram. Assim é a vida. 
 
 
Na Curuzu, nesta tarde de domingo, que presumo ensolarada, dezenas de pais orgulhosos estarão escoltando os filhos, na esperança de que o objeto da paixão não os decepcione.
O Paissandu, que depende somente de 180 minutos para retornar à Série B, é o alvo desse sentimento. E certamente saberá retribuir à altura.

(Coluna publicada na edição do Bola/DIÁRIO deste domingo, 09) 

3 comentários em “Coluna: Sobre pais e filhos

  1. Pertenço a uma família inteira de remistas e esta tradição permaneceu em mim, nos irmãos e todos os primos. Minha ex-esposa pertence a uma família de bicolores e, a despeito de toda pressão que minhas filhas sofreram de primos, primas. tios e avós, elas vieram para o lado do paizão e são remistas em Belém e tricolores no RJ. Para conseguir este feito eu usei um fortíssimo apelo emocional: mesada!…rs. Parabéns pelo nosso dia.

  2. Pois lá em casa, nem dinheiro, passeios e idas ao baenão com o meu pai remista, fez com que eu errasse na minha escolha. Como minha querida mãe e toda a família dela, hoje defendo com orgulho e paixão a bandeira alvi-azul.

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