Há quem possa ver diferença nos casos que envolvem as punições a Edson Gaúcho, técnico do Paissandu, e ao S. Raimundo, finalista do campeonato. O treinador foi suspenso por 30 dias, por invasão de campo, ameaça ao árbitro e prática anti-desportiva. O representante santareno perdeu um mando de campo e foi multado em R$ 10 mil.
É justamente aí que as histórias se misturam. Gaúcho fez todas essas estripulias em Santarém, no fim do jogo vencido pelo Paissandu no returno do campeonato. Ao incitar a torcida, com gestos estabanados e agressivos, acabou dando origem à reação igualmente destemperada por parte de alguns torcedores, que atiraram objetos ao campo de jogo.
As imagens do tumulto revelaram o completo desequilíbrio do treinador, que precisou ser contido pelos jogadores do Paissandu. Depois, graciosamente, insinuou que teria agido daquela forma com o intuito de “esfriar” o jogo (o Paissandu vencia por 2 a 1), o que agrava ainda mais seu comportamento, pois evidenciaria premeditação.
Justa a punição a ambos? Sim, a lei enquadra com rigor atitudes do gênero. Bem, se os fatos estão interligados e há procedência na decisão do tribunal da Federação Paraense de Futebol, por que o técnico foi anistiado (obteve efeito suspensivo) e vai poder trabalhar normalmente nos jogos finais do campeonato, enquanto o S. Raimundo terá que cumprir a sanção que lhe coube?
Deve haver alguma filigrana jurídica que explique as deliberações do tribunal, mas, à luz da lógica e da coerência, configura-se um típico caso de dois pesos, duas medidas, com evidente prejuízo para o clube do interior.
O S. Raimundo, que ensaia recorrer ao STJD, tem todas as razões do mundo para espernear.
Há uma clara situação de injustiça, pois um fato está diretamente associado a outro. Se Gaúcho pode ser perdoado, entendendo-se, nesse caso, que os juízes avaliaram que não representa risco à situação de jogo, apesar de todo o escarcéu feito em Santarém, o S. Raimundo pode brandir a mesma alegação, visto que juntou provas e identificou os torcedores responsáveis pela bagunça no estádio.
O campeonato caminha para um desfecho interessante no aspecto técnico, com a presença (pelo segundo ano consecutivo) de um clube emergente do interior na decisão do título. Pena que, fora das quatro linhas, prevaleçam ainda artifícios que põem em xeque a lisura da disputa e desnudam o atraso estrutural do nosso futebol.
Isso tudo como se já não bastasse a confusa decisão da FPF, que já havia antecipado sua preferência pelos dois jogos finais na capital, contrariando seu próprio critério para a decisão do returno (jogos em Belém e Santarém) e que já havia contrariado a lógica do turno, quando o Paissandu teve as duas partidas decisivas marcadas para Belém.
São procedimentos retrógrados, quase amadores, que acentuam injustiças e perpetuam privilégios descabidos.
(Coluna publicada na edição do Bola/DIÁRIO, nesta quarta-feira, 29/04)